Demorámos menos de um ano, desde a identificação do vírus SARS-CoV-2, a desenvolver uma vacina. Por comparação, foram precisos 43 anos para termos a vacina do ébola e 13 para a da hepatite B. Este é um facto do qual nos devemos orgulhar. Alcançámos um feito extraordinário, em resultado de um nível de preparação muito superior. E fizemo-lo principalmente graças ao investimento em ciência fundamental.
A vacina da BioNTech é um exemplo importante. A tecnologia envolvida, não inicialmente voltada para um fim específico, foi financiada pelos programas europeus de ciência e inovação e, numa última fase, por bolsas do European Research Council (ERC) do Horizonte 2020. Investimos em conhecimento puro e isso proporcionou-nos o caminho para a solução. Mesmo antes de sabermos que precisaríamos de uma. Julgo que já não será necessária mais nenhuma prova da importância do investimento em investigação cientifica, em todos os seus patamares.
No entanto, a nossa resposta à covid-19 também nos mostrou que há muitos outros domínios que precisam de melhorias. No caso da Europa, precisamos desde logo de ampliar as nossas capacidades. Não esqueçamos que, embora a União Europeia tenha financiado originalmente a BioNTech, esta precisou de se associar a uma empresa norte-americana, a Pfizer, para poder dar o passo seguinte.
A Europa precisa de ser mais eficaz a transformar o conhecimento em produtos e soluções, bem como a levá-los rapidamente aos cidadãos. Precisa de um ecossistema bem preparado para a inovação na saúde, sustentado por sólidos investimentos, pela eliminação de barreiras burocráticas e pelo combate à fragmentação do mercado.
Este é o momento certo para construirmos uma verdadeira união europeia da saúde. Uma união com mais cooperação na investigação científica, tanto a nível interno como com o resto do mundo, e com níveis de coordenação muito superiores. Entre os diferentes projetos de investigação e entre a ciência e os próprios sistemas de saúde.
A anunciada Agência Europeia de Preparação e Resposta a Emergências de Saúde (HERA) é um passo na direção certa. Pessoalmente, espero que, no futuro, esta seja uma entidade voltada para mais do que preparar e lidar com a resposta a crises específicas. Deverá também funcionar como uma verdadeira Agência Europeia de Investigação e Desenvolvimento Biomédico, para promover a cooperação nesta área. Existem muitos outros desafios de saúde compartilhados por todos os Estados-membros e devem ser enfrentados com estratégias comuns.
A cooperação público-privada é também uma frente muito importante. Mais uma vez, as vacinas da covid-19 desenvolvidas na Europa só foram possíveis graças a níveis sem precedentes de cooperação entre estes setores. E esse impulso não deve ser desperdiçado. Estou particularmente envolvida com este assunto, sendo relatora pelo Parlamento Europeu de duas parcerias europeias na área da saúde, a Innovative Health Initiative e a Global Health, e a minha meta é ajudar a criar condições para que estas sejam acessíveis a cada vez mais parceiros e tenham cada vez mais impacto.
Os dados de saúde são outro grande problema na União Europeia. Simplesmente não temos sistemas eficientes para recolher e partilhar a informação, tanto a nível nacional como em toda a UE. Em Portugal, por exemplo, um dos problemas que hoje enfrentamos é como lidar com a informação fornecida pelos cidadãos que fazem o autoteste para o coronavírus. Não temos uma instituição centralizada para a reunir. Em vez disso, existem diferentes autoridades, com diferentes métodos e registos. Quando trazemos esse problema para a escala europeia, os desafios são ainda maiores.
No final, no conjunto das politicas europeias para a saúde, o nosso objetivo deve ser desenvolver o conhecimento e usá-lo para fornecer soluções acessíveis, económicas e eficientes para todos os nossos cidadãos.