Foi aprovado nesta terça-feira um acordo sobre a directiva europeia Women on Boards, relativa à participação das mulheres nos conselhos de administração, nas negociações entre o Parlamento Europeu e o Conselho Europeu. A directiva estabelece o objectivo de que pelo menos 40% dos lugares de administradores não-executivos das sociedades cotadas em bolsa sejam ocupados por mulheres.
A eurodeputada do PSD Maria da Graça Carvalho, relatora-sombra da directiva na Comissão dos Direitos das Mulheres e da Igualdade dos Géneros (FEMM), considera ser “um momento histórico, que será recordado no futuro como um marco na luta contra a discriminação baseada no género na União Europeia”.
Em comunicado, esclarece ainda que o principal obstáculo à concretização da directiva Women on Boards nunca foi o Parlamento Europeu, mas antes a forte oposição de alguns Estados-membros que, durante muito tempo, bloquearam a sua aprovação no Conselho Europeu.
Elza Pais, a presidente das Mulheres Socialistas, considera “bom” o acordo sobre a directiva Weman on Boards, e realça que os bloqueios da última década não se deveram a Portugal. Este acordo “só vem reforçar a Lei da Paridade Portuguesa de 2019”, que já contempla os 40% de mulheres em cargos na política e em cargos da administração. “O que falta é especificar os cargos executivos e os não executivos, pois quando não é especificado não se avança na lei”, esclarece, adiantando que o Governo vai fazer esta alteração através de uma iniciativa legislativa no curto prazo.
Segundo o livro branco Women on Boards/ISEG, publicado pelo Expresso em Dezembro, as 50 maiores empresas não cotadas (não abrangidas pela Lei da Paridade) têm apenas 13% de mulheres em cargos de gestão.
“Nas empresas cotadas a representação das mulheres na gestão passou de 16% em 2017 para 28% em 2021, o que é notável”, diz Joana Domingues, empresária e professora convidada de Liderança na Universidade Católica e no The Lisbon MBA.
“Esta melhoria deu-se sobretudo em cargos não executivos – hoje com 38% de mulheres. Nos cargos executivos - onde se tomam as decisões no dia-a-dia –, a representação de mulheres é de 14.5%”, explica.
A constitucionalista Eva Macedo, também investigadora dos Direitos da Mulher na Universidade do Minho, considera o acordo da futura directiva como “uma boa notícia, não só para as mulheres, mas para as sociedades, que dão aqui mais um passo no sentido de se tornarem mais representativas e, por consequência, mais democráticas e justas”. Diz mesmo ser “um avanço importante” face às posições mais conservadoras de alguns Estados-membros quanto aos direitos das mulheres nos últimos anos.
Para a investigadora da Universidade do Minho, a directiva vai obrigar o sector a consagrar a paridade nos conselhos de administração (embora apenas nos membros não executivos), sendo que isso significará a justa participação de mulheres (que constituem a maioria da população mundial) no processo de definição da estratégia e produção de decisão das empresas.
Em desacordo com esta directiva está Isabel Menéres Campos, advogada e professora auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade Católica do Porto. Considera que as empresas privadas devem ser livres de adoptar os critérios que “muito bem entenderem” para a composição dos seus órgãos dirigentes. No seu entender, “não há nenhuma razão para o legislador intervir desta maneira num assunto que apenas diz respeito à vida interna das empresas privadas”.
Partindo do princípio que “tem de haver igualdade de remuneração entre sexos” e que não pode a respeito das “condições de trabalho haver discriminações”, a docente universitária defende que “a escolha dos membros dos conselhos de administração deve ser feita com base em critérios de oportunidade, de perfil, de qualificações, de aptidões, de talentos ou de outros, definidos pelas próprias empresas”.
Actualmente, de acordo com o Instituto Europeu para a Igualdade de Género (EIGE), as mulheres representam menos de 30% dos membros dos conselhos de administração e apenas 8% dos CEO das principais sociedades cotadas da Europa. A realidade é muito diversa entre os Estados-membros, e Portugal está entre os países que já se encontram no principal patamar exigido pela directiva, embora tenha ainda de melhorar em vários aspectos, como na igualdade salarial e nos cargos da Administração Pública.
A Comissão Europeia apresentou pela primeira vez a proposta em 2012 e o Parlamento Europeu aprovou a sua posição de negociação em 2013. O processo foi bloqueado no Conselho Europeu por quase uma década, até que os ministros do Emprego e dos Assuntos Sociais finalmente concordaram com uma posição em Março.
Uma vez que o Parlamento e o Conselho tenham formalmente aprovado o acordo, a directiva entrará em vigor 20 dias após sua publicação no Diário Oficial da UE. Os Estados-Membros devem ter de implementar a directiva dois anos após sua aprovação.