Entre um conjunto alargado e importante de medidas relativas ao pacote ambiental Fit for 55, da Comissão Europeia, que serão votadas nesta sessão plenária do Parlamento Europeu, tem gerado particular tensão a questão das emissões de CO2 por novos veículos.
A proposta da Comissão é de reduzir essas emissões a zero a partir de 2035. Ou seja: estipular, na prática, a obrigatoriedade de todos os fabricantes se reconverterem essencialmente à venda de automóveis elétricos no prazo de 13 anos. Já a posição do Partido Popular Europeu tem sido a de fixar essa redução em 90%, com o objetivo de a tornar mais suave e exequível.
A votação terá lugar nesta quarta-feira à tarde, em Estrasburgo, e sinceramente não arrisco dizer qual das posições prevalecerá. O certo é que qualquer uma delas representará um salto de gigante em relação às metas atualmente estabelecidas, com um enorme impacto na melhoria da qualidade do ar das nossas cidades, no fim da dependência de fornecedores externos de combustíveis e no nosso alinhamento com os objetivos de combate às alterações climáticas.
O que me custa a aceitar, precisamente pelo progresso que se registará em qualquer das circunstâncias, é a intensidade deste debate em torno das metas dos 90% ou dos 100%, acompanhada de uma certa diabolização da indústria, quando deveríamos estar a focar-nos era na melhor forma de as concretizar. Continua a existir, em diversos setores, esta ideia de que a solução para todos os problemas está nas grandes metas. Quanto maiores, melhor! E nesse processo esquece-se que estas são apenas o início, e que de pouco servirão caso se revelem inatingíveis, ou caso sejam concretizáveis apenas com impactos negativos brutais sobre a economia e os cidadãos.
A indústria automóvel não vende petróleo. O seu negócio são os veículos. E se o que os clientes lhe pedem são veículos elétricos, são estes que irá produzir cada vez mais. Mas uma reconversão integral dos produtos fabricados não se alcança por decreto. Implica adaptar os meios de produção, investir em investigação e desenvolvimento, fazer os ajustes necessários em termos de números e qualificações dos recursos humanos - sob pena de enviar milhares para o desemprego - e, já agora, contar com uma infraestrutura preparada para receber o novo produto, o que no caso significará desde logo encontrar soluções para massificar os pontos de carregamento dos veículos elétricos, seja na via pública, nas empresas ou nas habitações.
Apesar do crescimento exponencial na procura e fabrico de veículos elétricos a que temos vindo a assistir, o total de automóveis de passageiros com estas características (100% elétricos ou híbridos com sistema de carregamento plug-in) vendidos na Europa ao longo do ano passado não chegou aos 1,4 milhões, para um total superior a 10 milhões de novas matrículas atribuídas. Em relação aos ligeiros comerciais e aos pesados, as diferenças foram ainda mais acentuadas.
Inverter estes números em pouco mais de uma década já é, por isso, um desafio suficientemente exigente. E é neste que nos devemos concentrar. É altura de todos, incluindo políticos e diversos setores da sociedade civil, perceberem que a indústria não é uma inimiga do combate às alterações climáticas e sim uma aliada fundamental. É com ela ao nosso lado que alcançaremos os objetivos. Não é por acaso que um dos motes do PPE tem sido: "Descarbonizar a Europa e não desindustrializar a Europa". Não podemos mudar destruindo. Temos de mudar criando valor acrescentado, criando empregos e riqueza para as nossas economias.