Imprensa Portugal a ver o comboio passar

Artigos de Opinião | 05-04-2023 in Diário de Notícias

De acordo com o noticiado, o governo já está a falhar no Plano Nacional de Investimentos (PNI) 2030 para os projetos ferroviários, por via dos atrasos decorrentes do projeto Ferrovia 2020, no qual algumas das empreitadas previstas já deveriam ter sido concluídas há 17 anos. Uma notícia que surge apenas alguns meses depois de o ministro das Infraestruturas ter garantido no Parlamento que tudo corria na perfeição com o referido Ferrovia 2020 e que seriam raros os projetos a arrastarem-se para lá de 2023.

Afinal, há investimentos de 450 milhões de euros, 22% do total do Ferrovia 2020 que ainda não passaram do plano das intenções, com a agravante de isto afetar seis dos quinze projetos previstos no PNI 2030, contemplando a construção de novas linhas e a modernização das antigas.

Ou seja: estão a ser criadas as condições para se perder mais uma oportunidade de ouro para resolver um dos maiores problemas do país a nível de infraestruturas, numa altura em que a União Europeia está a apostar forte na ferrovia, como forma de manter a mobilidade ao mesmo tempo que se combatem as alterações climáticas, e como um importante fator de coesão dentro da UE e de cada estado-membro, valorizando as regiões do interior.

Infelizmente, já ninguém fica surpreendido com a discrepância entre as intenções anunciadas pelos socialistas para a ferrovia e a realidade dos factos. Todos nos recordamos dos tempos em que José Sócrates prometia uma espécie de TGV para Badajoz, um projeto que, depois de muitos milhões de euros gastos em estudos, acabou enterrado no âmbito de uma crise economia que obrigou à entrada da troika no nosso país. Mas não é o facto de este tipo de problemas já não nos apanhar de surpresa que os torna menos graves. Porque a cada vez que isto sucede é o futuro do país que está a ser adiado.

Começa a ser evidente que existe, da parte de quem nos governa, uma completa incapacidade, não apenas para executar, mas desde logo para conceber planos estratégicos que sejam exequíveis.

Lemos que o primeiro-ministro mandou refazer parte do Plano de Recuperação e Resiliência, depois de muitas das iniciativas que contemplavam parcerias com privados terem ficado congeladas, por falta de interesse, comprometendo as futuras tranches desta importante almofada financeira, destinada a projetar o país para o futuro, mas até agora aplicada sobretudo na gestão corrente da máquina do Estado. Ouvimos o governo a insistir em "corredores verdes" do hidrogénio, indiferente às impossibilidades técnicas de tal ambição, e continuamos sem saber sequer quando serão construídas as interligações elétricas que são imprescindíveis para acabar com o isolamento da Península Ibérica em relação ao resto da Europa.

Poderia prolongar indefinidamente esta lista de exemplos, desde o eternamente adiado projeto do novo aeroporto de Lisboa à perigosa e ideologicamente enviesada estratégia do governo para resolver o problema da habitação. Mas julgo que não será preciso mais para que qualquer observador atento compreenda a tendência de décadas que aqui se evidencia. Numa palavra: desperdício. Desperdício de verbas, de tempo e de oportunidades.

Espero, sinceramente, que isto também tenha ficado claro para os portugueses, e que a forma como o PS tem gerido o país seja devidamente avaliada nos próximos atos eleitorais. Um governo, na sua essência, é um prestador de serviços, contratado pelos eleitores com determinados objetivos concretos: melhorar a qualidade de vida dos cidadãos; assegurar boa qualidade da saúde, da educação, dos serviços públicos em geral; criar condições para que o país se torne mais rico e mais competitivo internacionalmente.

Agora imaginemos um prestador de serviços, como eletricidade, internet ou água, que nos cobrasse uma pesada fatura todos os meses e que falhasse sistematicamente com o prometido. O que faríamos? Talvez não fosse má ideia apostar numa mudança de operador.

 

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