Imprensa “Olha ao que eu digo e não ao que eu faço”

Os debates televisivos valem o que valem em termos de influência nos resultados eleitorais. Mesmo quando há um vencedor claro, como foi o caso de Rui Rio no debate com António Costa antes das últimas legislativas, não há garantias de que tenham grande impacto. Dito isto, e partindo do princípio de que o objetivo de um debate é que os eleitores fiquem esclarecidos sobre as propostas dos candidatos para os diferentes temas, confesso a minha perplexidade com a avaliação de alguns especialistas ao que se passou no debate AD-PS desta segunda-feira.

O que eu vi foi um candidato a primeiro-ministro, Luís Montenegro, focado em dizer ao que vinha, e outro, Pedro Nuno Santos, mais preocupado em atacar os argumentos do adversário do que em demonstrar o mérito das suas propostas, falhando nas poucas ocasiões em que o tentou fazer.

Foi assim na discussão sobre as questões de economia e fiscalidade. Montenegro explicou como, com mais produtividade, mais capacidade de captar investimento e mais exportações, a AD projeta ter o país a crescer fortemente. Já Pedro Nuno Santos, em vez de justificar a falta de ambição das suas próprias projeções, preferiu classificar de “aventureirismo” o desagravamento fiscal proposto pela AD, chegando ao ponto de afirmar que “o choque fiscal tira pressão para a inovação”.

Estamos a falar do mesmo “aventureirismo” que fez da Irlanda um caso de estudo a nível mundial, e atual sede europeia de algumas das maiores empresas tecnológicas do mundo. O mesmo aventureirismo que levou diversos países do Leste europeu, partindo de um plano muito inferior, a ultrapassarem facilmente a nossa economia.

PNS não explicou o seu raciocínio. Tal como não explicou como pretende selecionar os setores da economia aos quais, na sua visão de crescimento, irá alocar mais recursos, em detrimento de outros. A única coisa que deixou clara é que não confia nas empresas.

Nos restantes temas, nomeadamente na Saúde e na Habitação, mais do mesmo: Luis Montenegro a assumir metas ambiciosas, e a explicar o papel que o setor privado poderá ter na sua concretização; Pedro Nuno Santos a insistir numa visão estatizante da economia e a reforçar a sua descrença no mercado.

Com a Educação a ser aparentemente o mais consensual dos temas -  ainda que o PS prometa agora a estabilidade que antes nunca quis dar -, nota para a quase total ausência de referências à questão central das políticas ambientais e de energia, neste caso por opção, muito discutível, dos moderadores. “Quase” porque Luis Montenegro fez questão de introduzir este assunto, ao revelar que será, num governo por si liderado, um dos tópicos de três conselhos ministros temáticos mensais, a par dos assuntos económicos e da digitalização e combate à burocracia.

Quanto às notas dos comentadores, aparentemente, segundo alguns, PNS “ganhou” o debate por ter feito o que LM já tinha feito, de forma clara: lembrar que os protestos dos polícias devem respeitar as regras democráticas; E ter prometido fazer o que antes descartara: respeitar uma vitória eleitoral da AD. E Luis Montenegro não fez o mesmo quando disse, inúmeras vezes, que só governaria se a AD fosse a mais votada? Para os peritos, aparentemente não…

P.S. Pedro Nuno Santos esteve nesta terça-feira em Beja. Falamos da zona mais esquecida do país pelos governos do Partido Socialista. Prometeu investimento na ferrovia, na conclusão da autoestrada, na dinamização do aeroporto e muito mais. Para alguém que esteve sempre no governo ao longo dos últimos oito anos, tendo sido em parte desse tempo responsável pelas infraestruturas, não deixa de ser irónica esta súbita paixão pelo Alentejo.  À imagem do debate de segunda-feira, no qual várias vezes prometeu mexer em setores nos quais teve responsabilidades, mas nada vez, o seu mote parecer ser cada vez mais: “Uma coisa é o que eu digo e outra o que eu faço”.

Leia o artigo completo no site do Diário de Notícias, clicando aqui.