O setor automóvel em geral, desde a indústria até às instituições de investigação científica, sempre foi um motor de inovação na Europa. Não apenas em proveito próprio, mas para toda a indústria. Muitos dos avanços alcançados pela indústria automóvel, nomeadamente em termos de eficiência energética e redução de emissões, estabeleceram padrões para outros setores, tais como as indústrias de consumo intensivo de energia. E fizeram-no antes do Pacto Ecológico Europeu, o European Green Deal, e das diferentes iniciativas legislativas destinadas a concretizá-lo.
De resto, no caso específico da investigação científica e inovação, tanto aquela que é desenvolvida pelas próprias marcas como a que é feita pelos laboratórios que colaboram com a indústria, este papel tem-se estendido à contribuição para o processo de decisão política. A ERTRAC, associação europeia que representa a investigação científica do setor automóvel, produz regularmente “roteiros” de investigação e inovação, agendas estratégicas de investigação, posições relativas a iniciativas legislativas e contributos para os Programas-Quadro de Ciência e Inovação que têm sido fontes de inspiração para a Comissão Europeia, o Parlamento e o Conselho.
Por tudo isto, quando os especialistas do setor nos fazem um alerta em relação ao rumo que as decisões políticas estão a seguir, é importante dar-lhes ouvidos. E uma questão que tem sido insistentemente referida por estes é a necessidade de diversificarmos as soluções tendo em vista a descarbonização do setor.
Os transportes rodoviários continuam a ser, apesar dos avanços referidos, dos principais contribuidores para as emissões de gases com efeito de estufa, e também daqueles para os quais foram definidos objetivos mais exigentes. O pacote de medidas Fit-for-55 inclui uma meta de “zero emissões de escapes” a partir de 2035, começando pelos veículos ligeiros e depois estendendo-se aos pesados. Concretizar este objetivo significa, num horizonte temporal muito curto, de pouco mais de uma década, eliminar progressivamente toda a produção de novos veículos com motores de combustão interna.
As alternativas serão fundamentalmente os veículos elétricos, nos quais será necessário fazer um enorme investimento. Não apenas em todo o ciclo que vai da investigação científica à produção em série, mas também na criação de condições para a substituição de toda a atual frota automóvel europeia. Desde logo, a implementação, em todos os Estados-Membros, de uma rede de abastecimento que garanta a mobilidade de particulares e empresas. Sem se dar esse passo, mesmo que o custo dos veículos deixe de ser um obstáculo para muitos cidadãos, dificilmente será possível alcançar esta migração em massa para os veículos elétricos.
Ao mesmo tempo, esta transição coloca enormes desafios do ponto de vista da disponibilidade de energia. Um estudo da ERTRAC estima que, até 2050, o setor dos transportes represente 50% dos consumos de eletricidade na Europa. Isto, ao mesmo tempo que também outras atividades, nomeadamente industriais, irão aumentar substancialmente os seus consumos, como parte dos seus processos de transição verde.
A pressão sobre a produção de energia elétrica será, por isso, muito significativa. E mesmo apostando de forma decidida na produção de renováveis, a União Europeia poderá ver-se obrigada a importar quantidades significativas de energia, nem sempre produzida com os mesmos critérios de sustentabilidade que definimos para nós próprios.
É, por isso, importante ter uma perspetiva global e de longo prazo do setor dos transportes quando se tomam medidas que irão determinar o seu rumo no futuro. Na minha opinião, e é isto que os especialistas do setor também defendem, o foco principal tem de estar mais no objetivo – a descarbonização. No que respeita às tecnologias, obviamente que as soluções elétricas serão sempre determinantes, mas não vejo motivos para excluirmos outras soluções, como por exemplo os combustíveis de origem renovável, se estas nos oferecerem os mesmos resultados.
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