À primeira vista esta cimeira do clima desiludiu. Com Quioto a terminar, e o Acordo de Paris a vigorar na prática a partir de 2020, esperavam-se compromissos concretos em Madrid, garantindo uma transição eficaz. Porém, não houve entendimento em torno do famoso artigo 6, relativo aos mercados de carbono, que ficou fora da declaração final. E o reforço das metas de redução das emissões, assumido por menos de metade das delegações nacionais, ficou para legislar no próximo ano nesses países.
Mas não foi tudo em vão. Houve reconhecimento do impacto transversal das alterações climáticas, traduzido na discussão de temas como os oceanos, a aprovação de apoios financeiros aos países mais ameaçados, a constatação da particular posição das mulheres nesses países, do papel da ciência nas batalhas que nos aguardam.
Houve ainda a noção, clara para quem esteve na cimeira, de que mesmo nos países que mais resistência oferecem a ação climática não é uma miragem. Porque esta já não depende apenas dos governos, tendo-se estendido a todos os setores da sociedade.
Psicologicamente, o governo dos Estados Unidos já está fora do Acordo de Paris. Sentiu-se ao longo desta COP25. A administração norte-americana esteve representada em Madrid, participou em reuniões e em encontros bilaterais, mas nunca com o empenho demonstrado no passado. Contudo, tivemos contactos com outras instituições daquele país que nos relataram o muito que está a ser feito de forma descentralizada. Ao nível dos estados, das cidades. Na adaptação de cursos superiores a matérias relacionadas com o clima. No desenvolvimento de tecnologias amigas do ambiente. No apoio que dão ao resto do mundo nas previsões meteorológicas, área onde são líderes.
Os Estados Unidos não se resumem a Washington ou à Casa Branca. E o mesmo pode ser dito de vários outros países. Ignorar esse facto seria, não só injusto, como objetivamente errado, porque nos conduziria a conclusões distorcidas sobre o papel que irão desempenhar daqui para a frente.
Na sexta-feira, os eurodeputados presentes na COP25 reuniram com Laurence Tubiana, CEO da European Climate Foundation. O seu nome poderá dizer pouco à generalidade dos europeus, mas não é exagero afirmar que esta francesa teve um papel importante na definição do engenhoso e flexível – por comparação com Quioto – Acordo de Paris.
Desta vez, Tubiana falou-nos noutra ideia na qual tem vindo a trabalhar: a “teoria da liderança distribuída”. Basicamente, propõe, além de se considerar os países representados pelos seus governos, e pelo que as suas economias fazem como um todo, deveria valorizar-se a ação dos seus diferentes stakeholders: as cidades, as organizações não governamentais, a juventude.
Dei por mim a questionar-me se não se poderiam também contabilizar essas ações como esforços no combate às alterações climáticas. A concretização desta ideia seria complexa em termos de gestão das metas e do seu cumprimento. E não vale a pena alimentar-se a ilusão de que será possível atingir objetivos sem os governos. Mas o princípio faz sentido. Porque não dar mais peso à sociedade quando esta está tão envolvida nestas batalhas?
Nos últimos 20 anos participei quase numa dezena de cimeiras do clima. Comecei em Bona, em 1999. Estive nas COP em representação do Governo português, da Comissão Europeia e como eurodeputada. Não me lembro de alguma vez ter visto tantos jovens como vi nestes dias em Madrid.
Copenhaga, em 2009, foi a primeira COP verdadeiramente participada pela sociedade civil. Mas nada comparável ao que se viu agora. Na Dinamarca viam-se alguns jovens adultos, na casa dos 20 anos. Em Madrid eram centenas, muitos com 12 ou 13 anos, a encher auditórios. A exigir fazer parte da solução.
Na última semana, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anunciou o European Green Deal – o “homem na Lua europeu”, como o definiu. Os chefes de Estado europeus, reunidos em cimeira do Conselho da União Europeia, chegaram a um acordo de princípio visando tornar a Europa neutral, em termos de emissões, até 2050.
Fizeram-no respondendo a um claro apelo dos seus cidadãos, feito nas urnas e nas ruas. Quando outros líderes mundiais começarem a dar, de facto, ouvidos às suas sociedades, estaremos todos mais próximos do sucesso nesta batalha pelo nosso planeta.
A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico