A reação de Moscovo ao sexto pacote de sanções da União Europeia foi a esperada. A fazer fé na análise do Kremlin, parcialmente ecoada por alguns "analistas", o país não terá quaisquer dificuldades em encontrar novos compradores para o seu petróleo, enquanto os cidadãos europeus continuarão a sofrer com a escalada de preços da energia. Só faltou mesmo declarar-se que, no final de contas, a Rússia até saiu a ganhar com a decisão aprovada no Conselho Europeu extraordinário desta semana.
Como todas as mentiras, esta narrativa tem uma pontinha de verdade. Mas, como todas as mentiras, tem perna curta. A confirmarem-se as projeções anunciadas pela presidente da Comissão Europeia, Úrsula von der Leyen, com o embargo a todas as entradas por via marítima as exportações de petróleo russas para a UE cairão para 10% ou 11% dos atuais valores. Ou seja: está em causa a perda de 90% de uma receita que, segundo estimativas do think tank independente Carnegie Endowement, ascendia a perto de mil milhões de euros por dia. Isto, sem esquecer os compromissos assumidos pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido de aplicarem sanções idênticas.
Mesmo sendo praticamente certo que Putin encontrará outros clientes dispostos a reforçarem as importações do seu petróleo (a tal pontinha de verdade), nem os mais céticos em relação ao impacto desta sanção da UE acreditam que a Rússia conseguirá cobrir totalmente o volume de vendas perdido, muito menos as receitas realizadas com as transações com a União Europeia. Pelo menos no futuro próximo.
Estas sanções terão um impacto real na economia russa. Significarão menos receitas para alimentar a máquina de guerra de Moscovo. Não menos importante, constituirão um passo decidido rumo ao objetivo de retirar a Putin a "arma" da dependência energética da UE face ao seu país.
Há quem veja no regime de exceção concedido à Hungria, à República Checa e à Eslováquia, países aos quais será permitido continuarem a importar petróleo russo através de pipeline, um sinal de deterioração da unidade que a UE tem mostrado nesta matéria. Há quem afirme que o controverso Viktor Orbán passou a ser oficialmente o homem de confiança de Putin na Europa. Pessoalmente, não vejo nada disto. O que vejo é uma Rússia cada vez mais isolada e uma UE cada vez mais determinada no plano político. Disposta a fazer compromissos, mas sem se desviar do seu rumo.
Essa determinação espelha, em grande medida, o enorme consenso existente na sociedade europeia sobre a necessidade de apoiar a Ucrânia e de punir a Rússia. Um consenso que tem resistido mesmo face às consequências pesadas que já estão a ser sentidas. E que é um elemento absolutamente decisivo para o sucesso futuro das sanções adotadas.
Por isso mesmo, é fundamental que os decisores políticos europeus revelem determinação e consenso idênticos na reação, em termos económicos e sociais, aos efeitos colaterais desta guerra. Se queremos garantir que a segunda parte da narrativa russa se revelará tão falsa como a primeira, não podemos permitir que os cidadãos, as empresas, as indústrias da Europa, sejam cada vez mais penalizados pela atual situação.
Uma resposta que deve passar desde logo por medidas no plano da energia, ainda não suficientemente acauteladas, sobretudo no plano financeiro, pela iniciativa REPowerEU, mas também por de uma rigorosa monitorização dos mercados, pela proteção social a toda a classe média - e não apenas às famílias mais carenciadas - e pelos apoios concretos às empresas, através de medidas, tanto nos planos domésticos como no europeu, que simplifiquem procedimentos, reduzam burocracias e acelerem o acesso ao financiamento.