Fiquei genuinamente preocupada com a débil reação do porta-voz da União Europeia para os assuntos externos e políticas de segurança, Peter Stano, ao anunciado alargamento do grupo das economias emergentes - os chamados BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).
Descartar como um assunto alheio à UE, e do qual nos limitamos a "tomar a devida nota", a integração naquele grupo de seis novos países, incluindo grandes exportadores de petróleo como a Arábia Saudita, os Emiratos Árabes Unidos e o Irão, ou resulta de uma estratégia de comunicação deficientemente preparada ou, mais grave, de um genuíno alheamento do que está em causa por parte de quem tem por funções falar em nome da Europa no plano internacional.
Os BRICS representam já 42% da população mundial e 31,5% do PIB mundial - mais do que os 30% do G7, estimando-se que cheguem aos 50% em 2030. E têm consciência da força que estes números representam. Ao ponto de ter sido referida a possível adoção de uma moeda própria, durante a cimeira de Joanesburgo que consagrou este alargamento.
É certo que se trata de um grupo heterogéneo, tanto nos seus modelos de governo como na dimensão das suas economias. E mais heterogéneo será com a entrada, a partir de janeiro de 2024, dos novos membros, entre os quais se incluem, além dos já referidos países árabes e do Irão, a Argentina, o Egito e a Etiópia. No caso da Argentina e do Egito, estão em causa os maiores devedores ao FMI. Já a Etiópia debate-se com uma guerra civil no Tigray. E tudo isto pode criar a ilusão, tanto na UE como nos Estados Unidos, onde as reações oficiais foram igualmente vazias, de que não existe nos BRICS uma verdadeira ameaça, económica ou política.
Mas a verdade é que, por mais que as forças e os objetivos dos membros desta organização sejam bastante díspares, com muitos a procurarem apenas reforçar e diversificar as suas posições no xadrez global, este grupo tem como grandes motores a China e a Rússia. Países que, por razões diversas - essencialmente económicas, no caso do primeiro, mas também políticas no segundo -, estão ativamente empenhados em criar uma nova ordem mundial.
Recentemente, o jornal norueguês Aftenpost referiu que os BRICS se estão a tornar num "clube global para líderes autoritários e reacionários". Talvez tenha sido uma afirmação exagerada. Mas se ter a China, a Rússia, o Irão e a Arábia Saudita reunidos no mesmo "clube" não constitui motivo de preocupação para o Ocidente, não sei o que poderá levar-nos a arrepiar caminho.
O que deveria ser prioritário para a UE e para os Estados Unidos, na reação ao movimento a que estamos a assistir, era identificar os motivos para a crescente atratividade desde grupo para grandes países da Ásia, de África, da América do Sul e da Europa (fala-se no interesse da Bósnia-Herzegovina), com muitos dos quais temos fortes laços históricos e culturais, e agir em conformidade. Ouvindo os motivos destes países e procurando renovar e reforçar a cooperação com os mesmos a todos os níveis. E era isso que o senhor porta-voz da UE deveria ter referido na sua reação, em vez de desvalorizar o tema.
Do lado de Pequim, apesar de a China estar a caminho de, mais ano menos ano, se tornar na maior economia mundial, vai-se apresentando os BRICS como uma alternativa à "hegemonia dos Estados Unidos" e dos seus "aliados ricos". Na Rússia, apesar de todas as atrocidades cometidas pelo regime de Putin nos últimos anos, vai-se fazendo a apologia de supostos "valores" que o Ocidente alegadamente quer destruir, impondo a sua visão ao mundo. E tudo isto nos parece obviamente ridículo e demagógico. Mas desvalorizar o poder da propaganda e, pior, deixá-la passar sem resposta, é um erro que se costuma pagar caro.
A Europa tem de ter uma posição clara nesta matéria. Tem de fazer ver rapidamente aos países em desenvolvimento, incluindo a todos aqueles com os quais mantém atualmente boas relações, que é um parceiro confiável, que os ajudará a alcançarem os seus objetivos de crescimento económico e social. Caso contrário, esse espaço será cada vez mais ocupado por outros.
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