Universidade Lusófona de Humanidade e Tecnologias: XI Congresso Nacional de Engenharia do Ambiente - Certificação Ambiental e Responsabilidade Social das Empresas.
Rumo a cidades de baixo carbono - Caso da Vila de Óbidos: Lina Lopes 1, Maria da Graça Carvalho2
Sumário:
As cidades e as zonas urbanas são responsáveis pela maioria das emissões de Gases com Efeito Estufa. As cidades são grandes consumidoras de energia e grandes emissoras de CO2. A maioria da população europeia (e mundial) está concentrada nas cidades. As cidades são particularmente vulneráveis às alterações climáticas.
A diminuição das emissões de GEE não só contribui para o combate às alterações climáticas como gera cidades com melhor qualidade de vida. O problema que se levanta é pois o seguinte: como poderão as cidades, grandes consumidoras de energia, tornar-se cidades de baixo carbono e energeticamente eficientes.
As cidades signatárias do Pacto dos Autarcas comprometeram-se com metas quantificadas. Em particular, o Município de Óbitos, sendo signatário do Pacto dos Autarcas, comprometeu-se a reduzir em mais de 20% as suas emissões de CO2 até 2020.
O presente artigo caracteriza o modelo adequado ao estudo das emissões de CO2 nos no subsector dos edifícios municipais localizados na zona histórica de Óbidos, nomeadamente nas freguesias de Santa Maria de Óbidos e de São Pedro de Óbidos e equaciona possíveis aplicações do mesmo.
Palavras-chave: Alterações climáticas, Energia, Cidades, Sustentabilidade, Políticas Europeias
1. Introdução
As cidades e as zonas urbanas são responsáveis por cerca de 75% do total das emissões de Gases com Efeito Estufa (GEE) (UNFCCC, 2009).
Na Europa, aproximadamente 75% da população vive em áreas urbanas. Prevê-se que este valor ultrapasse os 80% até 2020. A Europa será uma sociedade cada vez mais urbana com quatro em cada cinco europeus a viverem em cidades.
O consumo mais significativo de energia e o maior volume de emissões de CO2 ocorre nas cidades. É nas cidades que as populações se expandem mais rapidamente como resultado dos elevados padrões de vida e da riqueza material de que desfrutam (Fong et al, 2007a, 2008c; IGES, 2004).
Espera-se que em 2030 dois terços da população mundial viva em áreas urbanas. Sendo as cidades particularmente vulneráveis aos impactos das alterações climáticas, é natural que aumente o seu empenho no combate às alterações climáticas.
Por outro lado, a procura de energia é um dos elementos definidores das cidades modernas. O seu funcionamento assenta fortemente no consumo de combustíveis fósseis, o que leva a um aumento das emissões de gases com efeito de estufa.
Assim, a diminuição das emissões de GEE, nomeadamente a diminuição das emissões de CO2, é um problema com que as cidades se debatem. A diminuição das emissões de GEE gera cidades com melhor qualidade de vida para a geração presente e para as gerações vindouras. As cidades têm pois de adoptar medidas que permitam reduzir essas emissões de GEE, designadamente medidas de eficiência energética e de utilização de energias renováveis.
A Europa criou uma Estratégia para a Energia e para as Alterações Climáticas, na qual se destaca a política dos "3x20". Esta política estabeleceu as seguintes metas a serem alcançadas até 2020: redução em 20% das emissões de GEE (30% se existir um acordo global sobre clima); 20% das energias utilizadas devem ser renováveis; eficiência energética deverá ser aumentada em 20%. A base de comparação são aos valores registados em 1990, ano base estabelecido no protocolo de Quioto.
O problema que se levanta é pois o seguinte: como poderão as cidades, grandes consumidoras de energia, reduzir as emissões de CO2 e aumentar a sua eficiência energética? Por outras palavras: como poderão as cidades, grandes consumidoras de energia, tornar-se cidades de baixo carbono e energeticamente eficientes.
As cidades têm adoptado diferentes estratégias para resolver o problema. As signatárias do Pacto dos Autarcas comprometeram-se com metas quantificadas. Em particular, o Município de Óbitos, sendo signatário do Pacto dos Autarcas, comprometeu-se a reduzir em mais de 20% as suas emissões de CO2 até 2020, desenvolvendo um Plano de Acção de Energia Sustentável (PAES).
No presente estudo concentramo-nos no caso específico do Município de Óbidos, mais precisamente nas Freguesias de Santa Maria e de São Pedro de Óbidos, zona histórica da Vila de Óbidos, e no subsector urbano dos edifícios municipais aí localizados.
O estudo tem dois objectivos:
1) situar a zona histórica da Vila de Óbitos no processo das cidades de baixo carbono.
Para este efeito são referidas a metas preconizadas pelo Pacto dos Autarcas, de que a Vila de Óbidos é signatária, e o estado do seu cumprimento no plano nacional e internacional; a Vila de Óbidos é caracterizada geográfica e administrativamente; são apresentados os resultados do inventário de emissões de CO2.
2) definir o âmbito do estudo e o modelo adequado e equacionar possíveis recomendações e cenários.
Para este efeito é fundamentada a opção de estudo das emissões de CO2 no subsector dos edifícios municipais localizados na zona histórica de Óbidos; é formulado o modelo de uso final, descritas as suas características e referidas as suas possíveis aplicações.
•1.1 Pacto dos Autarcas
O Pacto dos Autarcas é um compromisso assumido por 2581 Autarcas de 29 países (28 europeus mais a Nova Zelândia). O Pacto enquadra a cooperação entre os actores (UE, países, cidades) das políticas de redução das emissões de GEE, nomeadamente de diminuição das emissões de CO2 (CM1, 2011). As cidades aderentes comprometem-se a reduzir em mais de 20% as suas emissões de CO2 até 2020, desenvolvendo um PAES.
No PAES os municípios devem indicar a forma como irão alcançar os seus objectivos de redução de CO2, estruturando as acções a empreender e formulando as medidas a adoptar de acordo com três pontos: 1) perspectiva a longo prazo e estratégia global; 2) resultados mais importantes do inventário de referência das emissões; 3) principais elementos do PAES.
Das 2581 cidades que assinaram o pacto, até hoje, apenas 430 (16,7%) entregaram o PAES na Comissão Europeia, e destas apenas 5 (0,002% do total) têm o plano aceite. Entre as cidades cujo plano foi aceite encontra-se uma cidade portuguesa - o Porto.
Na tabela 1 encontram-se as cidades com o PAES aprovado e a percentagem de redução de CO2 que o PAES assume.
Tabela 1 - Redução de CO2 nas cidades com PAES aprovados
(Adaptado de Convenat of Mayors, 2011)
Cidade (País) |
% redução de CO2 |
Porto (Portugal) |
45 |
23 |
|
26 |
|
21 |
|
65 |
Das 59 cidades portuguesas que assinaram o Pacto dos Autarcas, 6 já apresentaram o PAES. Na tabela 2 encontram-se as cidades portuguesas que dispõem de PAES com dados relevantes do mesmo (CM2, 2011). Das cidades que entregaram o PAES, apenas a cidade do Porto tem o seu plano aceite pela Comissão Europeia. As restantes cinco cidades aguardam ainda a aprovação do PAES.
Tabela 2 - Cidades Portuguesas com PAES
(Adaptado de Convenat of Mayors, 2011)
Cidades |
Data de PAES |
Nº de Habitantes |
Área (Km2) |
% de redução de CO2 |
Ano de referência |
TCO2 (para o ano de referência) |
Proposta de redução de CO2-2020 (tCO2/ano) |
Lisboa |
3 Dezembro 2008 |
479.884 |
84 |
20 |
2002 |
2.320.000 |
522.000 |
Vila Nova de Gaia |
30 de Novembro 2009 |
312.742 |
170 |
25 |
1998 |
1.340.000 |
- |
Oeiras |
10 Fevereiro 2010 |
170.000 |
45,84 |
20 |
2006 |
742.049 |
148.410 |
Almada |
1 Março 2011 |
165.991 |
71 |
22 |
2006 |
361.612 |
299.871 |
Cascais |
20 Setembro 2010 |
188.244 |
97 |
20 |
2005 |
949.464
|
189.893
|
Porto |
26 Outubro 2010 |
238.954 |
42 |
45 |
2004 |
1.376.300 |
625.340 |
O primeiro passo na preparação do PAES consiste na escolha do ano base. Para o ano base escolhido os municípios deverão elaborar o inventário de emissões de CO2 relativo a esse ano. Se possível deverá ser adoptado o ano de 1990, ano base estabelecido no Protocolo de Quioto. Mas as cidades podem adoptar um ano base posterior. A escolha do ano base depende sobretudo dos dados que a cidade tem disponíveis para serem tratados. Nos casos em que a autarquia não disponha de dados fiáveis, que lhe permita conhecer de forma satisfatória as emissões de CO2, deverá ser escolhido um ano posterior a 1990 que seja, simultaneamente, o ano mais próximo do ano em que podem ser recolhidos os dados mais completos e fiáveis.
O ano base serve de referencial para comparar as taxas de redução das emissões de CO2 na EU, nomeadamente entre as cidades que assinaram o Pacto dos Autarcas.
1.2 Vila de Óbidos
O nome "Óbidos" deriva da palavra latina "oppidum" que significa "fortaleza" ou "cidade fortificada".
A nível nacional o Município de Óbidos abrange uma área de 142,0 km² e localiza-se na sub-região Oeste do Distrito de Leiria, delimitada a nordeste e a leste pelo município das Caldas da Rainha, a sul pelo município do Bombarral, a sudoeste pelo município da Lourinhã, a oeste pelo município de Peniche e a noroeste tem uma costa banhada pelo Oceano Atlântico.
O Município de Óbitos tem uma população de 11 377 habitantes (Censos de 2006). O município encontra-se subdividido em 9 freguesias caracterizadas na tabela.
Área Geográfica (km2) Área Geográfica (Km2)* |
População Residente |
População Residente por Sector Económico* |
População Residente* |
|||
Primário |
Secundário |
Terciário |
Sem Actividade Económico* |
|||
Concelho |
142,0 |
11377 |
842 |
1566 |
2334 |
5220 |
Freguesias |
||||||
A - dos - Negros |
16,82 |
1493 |
102 |
267 |
276 |
825 |
Amoreira |
19,39 |
985 |
47 |
159 |
203 |
559 |
Olho Marino |
18,32 |
1258 |
186 |
127 |
209 |
697 |
Óbidos (Santa Maria) |
22,13 |
1788 |
90 |
284 |
435 |
936 |
Óbidos (S. Pedro) |
10.41 |
1280 |
98 |
123 |
374 |
657 |
Sobral da Lagoa |
4.88 |
420 |
42 |
73 |
49 |
249 |
Vau |
32.90 |
875 |
145 |
125 |
105 |
495 |
Gaeira |
10.20 |
1858 |
27 |
337 |
522 |
934 |
Usseira |
7.12 |
918 |
105 |
71 |
161 |
565 |
(Adaptado de ANMP, 2011)
(* População Residente sem Actividade Económica corresponde à população Reformada; à procura do 1º emprego; Procura de Novo Emprego e outras, adaptado de http://www.cm-obidos.pt)
A zona histórica de Óbidos é constituída por duas freguesias, Santa Maria de Óbidos e São Pedro de Óbidos, e encontra-se disposta numa colina cercada por uma muralha. Esta zona estende-se por uma área de 32,54 km ² com uma população de 3068 habitantes (Censos, 2006).
O programa "Óbidos Carbono Social" teve início em 7 de Novembro de 2007. O seu objectivo é reduzir as emissões de GEE em 40%, até 2020, ou seja, o dobro do estabelecido pela União Europeia.
A linha de base, que irá permitir avaliar a quantidade de emissões de dióxido de carbono (CO2) e o impacto de medidas na redução de CO2, foi construída entre Abril de 2006 a Abril de 2007. Em 25 de Junho de 2010 a Vila de Óbidos assinou o Pacto dos Autarcas. O PAES encontra-se ainda em elaboração.
O Município de Óbidos realizou um estudo (dados fornecidos pela Divisão do Ambiente da Câmara Municipal de Óbidos) com vista ao inventário de emissões de GEE no Concelho de Óbidos e a definição da linha estratégica para o combate às alterações climáticas. Foi considerado como referência o período de Abril de 2006 a Abril de 2007. O estudo identificou as principais fontes emissoras e calculou as respectivas emissões de GEE em toneladas de CO2 equivalente, conforme descrito na tabela.
Tabela - Emissões de CO2e por fonte emissora
Fontes |
CO2e em toneladas |
Consumo de Electricidade |
24821,42 |
Consumo de Combustíveis |
34685,77 |
Consumo de fertilizantes |
113,86524 |
Resíduos (produção de biogás) |
52347,42 |
Total |
111968,47 |
O sequestro de emissões foi calculado tendo em conta a mancha florestal do Concelho de Óbidos. Obteve-se como resultado para as florestas e áreas de reflorestação o valor de 15295,68 ton. CO2e
A partir deste valor e do total das emissões obtido anteriormente determinou-se o balanço total das emissões de CO2 que ascende a 96672,79 t CO2e.
Após elaboração da linha base foi definido um plano de acção que inclui um conjunto de medidas com vista à redução das emissões de GEE do Concelho. Para a estimativa de redução de emissões expectável foi igualmente aplicado um conjunto de metodologias aprovadas pela Convenção Quadro das Nações Unidas para o Combate às Alterações Climáticas, adaptado especificamente para cada tipologia de acção.
2. Metodologia
2.1 Âmbito do Estudo
a) Emissões de CO2
O CO2 é o gás que mais contribui para o efeito de estufa (IPCC, 2007). A redução das emissões de CO2 tem assim uma importância crucial no combate às alterações climáticas. No caso das cidades a redução de CO2 é o elemento chave para as tornar cidades de baixo carbono. Por esta razão este estudo concentra-se nas emissões de CO2.
b) Zona urbana
As cidades são as grandes responsáveis pelo aumento do consumo de energia e de emissões de CO2. Por isso este estudo concentra-se na área urbana.
Para o cálculo das emissões de CO2 é usual considerarem-se dois grandes sectores:
Sector 1 Edifícios, equipamentos/instalações e indústrias;
Sector 2 Transportes.
Neste estudo apenas nos interessa o sector 1 que se subdivide em cinco subsectores:
O estudo é focado no subsector dos edifícios, equipamentos/instalações municipais, situados na zona histórica do Município de Óbidos.
No essencial existem dois tipos de modelos: modelos econométricos e modelos de uso final. Os modelos econométricos consideram explicitamente as interrelações entre o sector energético e o resto da economia permitindo uma análise macroeconómica. Estes modelos utilizam dados agregados e permitem calcular o melhor mix energético do ponto de vista económico.
Para o estudo das emissões de CO2 no subsector dos edifícios, equipamentos/instalações municipais situados na zona histórica do Município de Óbidos, adoptou-se um modelo de uso final (Swisher, Jannuzzi & Redlinger, 1997 p. 29). Os modelos deste tipo partem de uma caracterização tanto quanto possível exaustiva das utilizações homogéneas de energia que, depois de agregadas, permitem apurar um valor global para o subsector. Este modelo é também designado modelo "bottom up", em oposição aos modelos que partem de uma caracterização mais agregada, a partir de variáveis macroeconómicas, também designados modelos "top down" ou modelos econométricos.
Na tabela apresentamos os parâmetros necessários para calcular o consumo energético para cada edifício municipal.
Tabela - Informação requerida para o modelo de uso final no subsector edifícios municipais
Indicadores |
Uso final |
Equipamentos |
Opcional:
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
O consumo energético é o produto de dois factores: nível de actividade do subsector energético e da intensidade energética (energia necessária por unidade de serviço energético). O consumo total dependerá da estrutura do subsector energético, i.e. da desagregação em serviços e respectivas intensidades energéticas, e é calculado de acordo com a fórmula seguinte:
Qi = quantidade do serviço energético i
Ii = intensidade energética para cada uso final i
A = área útil total do edifício
Pi = percentagem de A servida pelo uso final i
Mi = frequência do uso da energia do equipamento i
Depois de obtido o consumo energético E, o cálculo das emissões de CO2 é feito de acordo com a fórmula seguinte:
onde
Cf = coeficiente de emissão (tabela)
Na tabela indica-se o coeficiente de emissão para o ano de 2007, ano de estudo dos dados fornecidos pelo Município de Óbidos.
Tabela 6 - Coeficiente de emissão para o consumo de electricidade para Portugal
(adaptado de APA, 2007)
Coeficiente de emissão standard (tCO2/MWh) |
Coeficiente de emissão (tCO2-eq/MWh) |
0.369 |
0.750 |
Na tabela identifica-se a conversão dos GEE em unidades equivalentes de CO2 com base nos valores de GWP (Global Warming Potential).
Tabela - Conversão dos gases CH4 e N2O em CO2-unidades equivalentes
(adaptado de IPCC, 2007)
Massa do GEE em t de composto |
Massa do GEE em t CO2-equivalente |
1t CO2 |
1 t CO2-eq |
1t CH4 |
21 t CO2-eq |
1t N2O |
310 t CO2-eq |
3. Conclusão
Referências: