Neste Primeiro de Dezembro, em que Portugal celebra a Restauração da Independência, assinala-se também o Dia Mundial de Luta Contra a Sida. Mais de quatro décadas depois da sua identificação, esta doença já não nos intimida como nos primeiros tempos. O desenvolvimento de antirretrovirais eficazes e, sobretudo, o facto de estes se terem tornado mais acessíveis, associado a uma aposta forte no diagnóstico, tem-nos permitido transformar uma doença terminal numa condição crónica, com condicionalismos vários, mas que permite proporcionar aos doentes uma qualidade e uma esperança de vida próximas da normalidade.
A expansão do acesso ao diagnóstico e tratamento para além dos países desenvolvidos tem sido fundamental para o acentuar da curva descendente no número de casos e de mortes resultantes da Síndrome de Imunodeficiência Adquirida. Uma expansão assente na cooperação internacional, não apenas ao nível público, mas também envolvendo o setor privado.
Na minha carreira política, um dos maiores motivos de orgulho que tenho é o facto de ter estado associada, há quase duas décadas, na altura na qualidade de ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Portugal, à proposta feita por Portugal e Moçambique para o estabelecimento de uma Parceria entre a Europa e os Países em Desenvolvimento para a Realização de Ensaios Clínicos (EDCTP), centrada em três doenças - sida, malária e tuberculose.
Mais tarde, acompanhei a evolução do EDCTP no Parlamento Europeu, como relatora. Atualmente na sua terceira fase, esta parceria, agora conhecida por Saúde Global, viu o seu âmbito alargado para diferentes doenças infecciosas.
Além do grande impacto que tem tido na luta contra a sida, o EDCTP - ou Saúde Global -, que conta entre os seus parceiros com a Fundação Bill e Melinda Gates, conseguiu nos últimos anos progressos assinaláveis na área da malária, nomeadamente o desenvolvimento da primeira vacina contra esta doença, a qual começou já a ser ministrada.
É um programa que se tem revelado exemplar. A meu ver, o grande segredo do seu sucesso é o facto de se basear na cooperação, na convicção de que existe talento e capacidade científica em todo o lado, em vez do mero assistencialismo que caracterizou durante muito tempo as políticas de ajuda externa do ocidente. E esta é uma abordagem que devemos disseminar e ampliar.
Desde logo no que respeita à luta contra a sida que, apesar do que aqui referi, continua longe de estar ganha. Em 2020, de acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (UNAIDS Data 2021), 37,7 milhões de pessoas continuavam a viver com a doença, 1,5 milhões contraíram o VIH pela primeira vez e 680 mil perderam a vida. A grande maioria em África, especialmente na África Subsariana. Temos por isso de redobrar os nossos esforços. Os progressos conseguidos na luta contra a sida devem orgulhar-nos, mas não existem números satisfatórios, porque nenhuma vida humana é dispensável.
Mas devemos também levar este espírito de cooperação para o combate a outras doenças que causam a morte e o sofrimento de milhões, como o cancro e as doenças cardiovasculares. Incluindo na Europa.
Há muito que venho defendendo a necessidade de avançarmos para uma verdadeira União Europeia da Saúde, que nos permita articular esforços e investimento, desde a investigação científica à prestação de cuidados de saúde transfronteiriços. Nas doenças transmissíveis e não-transmissíveis.
Tal como a parceria Saúde Global e outras iniciativas semelhantes têm demonstrado, e tal como ficou claro com a resposta que fomos capazes de dar na Europa à pandemia de covid-19, somos infinitamente mais eficazes quando trabalhamos em conjunto no setor da saúde. Quando percebemos que ninguém está verdadeiramente livre de uma doença até que todos o estejam.
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