Quando a CIP me desafiou a escrever um artigo sobre Estratégia Industrial Europeia, no final de fevereiro, a realidade que conhecíamos era totalmente distinta daquela em que agora nos encontramos. Vivemos uma situação de emergência, a qual é antes e acima de tudo de saúde pública, mas cujas inevitáveis consequências económicas são já evidentes.
Os dados que nos chegam da China, relativos a janeiro e fevereiro, dão conta de quebras superiores a dois dígitos na produção industrial (-13,5% face ao período homólogo de 2019), nas vendas a retalho (-20,5%) e nos investimentos em ativos fixos (-24,5%). Um alerta sobre o que está para vir.
Nesta fase, em que a tempestade ainda não passou, a prioridade é cerrar fileiras na guerra contra o COVID-19. Os setores mais necessários no imediato, como o farmacêutico e de equipamentos médicos, esforçando-se por aumentar a produção. Outros, confrontados com dificuldades operacionais e quebras acentuadas na procura, adaptando-se e resistindo o melhor possível.
Não vale a pena iludirmo-nos: quando vencermos a crise na saúde iremos continuar a enfrentar a crise económica. E mesmo que ainda seja cedo para avançar cenários – porque desconhecemos a real dimensão do problema -, já temos elementos suficientes para saber que a União Europeia tem de começar a trabalhar em conjunto numa estratégia para o “pós-guerra”.
Há lições importantes que podem ser aprendidas de imediato. Em primeiro lugar, a necessidade de se repensar a excessiva interdependência global em certos setores estratégicos, nomeadamente nas referidas indústrias ligadas à saúde. Em segundo, a confirmação do valor inestimável do conhecimento humano, da investigação científica, no qual assenta a solução para esta crise, através do desenvolvimento de terapias e de uma vacina.
Há dois meses atrás, a estratégia industrial europeia estava a ser delineada no quadro do European Green Deal, tendo em conta a emergência climática e a necessidade de fazer a transição para uma economia descarbonizada, sem comprometer a competitividade e a liderança. Uma transição impossível sem uma forte aposta no triângulo do conhecimento – educação, ciência e inovação.
Terão essas prioridades deixado de fazer sentido? Serão seguramente necessários ajustes significativos. O abrandamento económico não deixará de se traduzir também em níveis inferiores de emissões de CO2, de consumo energético e de combustíveis fósseis. Basta ver a evolução do preço do gasóleo e da gasolina para constatar esse facto. E há setores da indústria, entre os quais grandes consumidores de energia, que terão de ser protegidos porque estão a ser fortemente abalados.
Mas respondendo diretamente a essa dúvida, julgo que não devemos deixar que essas medidas, necessárias, sejam confundidas com um recuo estratégico. Pelo contrário: os tempos que correm servem para nos lembrar que o controlo que imaginávamos ter sobre o nosso planeta era mais aparente do que real. Devemos trabalhar em conjunto sem nos desviarmos do rumo que traçámos para o longo prazo. E esse rumo passa por encontrar novas e melhores soluções.