A presente pandemia de coronavírus é, a vários níveis, o exemplo da tempestade perfeita a que a globalização nos pode conduzir.
O fenómeno a que chamamos de globalização trouxe-nos ganhos inegáveis. Há mais informação a circular, que chega instantaneamente aos quatro cantos da Terra. E isso traduz-se em benefícios educacionais, tecnológicos, culturais e até democráticos. As distâncias e as diferenças culturais deixaram de ser uma barreira aos negócios, o que tem permitido fazer crescer a economia mundial, melhorar a qualidade de vida das populações, reduzir conflitos. As viagens, por lazer ou em negócios, deixaram de estar reservadas às elites. Nunca foi tão barato andar de avião.
Mas o contraponto de todos esses benefícios também existe: a desinformação e o uso abusivo dos dados; o aumento das emissões de gases poluentes, por exemplo por via das viagens de avião ou da importação de matérias-primas e produtos que anteriormente eram obtidos localmente; e uma crescente interdependência global que leva a que, a cada vez que um país ou região se depara com uma crise, todo o mundo se ressinta.
A presente pandemia de coronavírus é, a vários níveis, o exemplo da tempestade perfeita a que a globalização nos pode conduzir. A enorme mobilidade das populações potenciou a disseminação, em escassos meses, de uma doença que começou – tanto quanto o sabemos – por estar circunscrita a uma cidade chinesa. A dependência global de componentes cujo fabrico está concentrado num grupo restrito de países, como a referida China e outros estados asiáticos, levou a que as quebras de produção nestes locais afetassem a indústria à escala planetária. E a tudo isso somam-se as medidas tomadas para conter a disseminação da Covid-19, as quais, de um momento para o outro, reduziram a escombros inúmeras atividades, do turismo ao desporto de alta competição.
A recessão que se anuncia será tão global como o mundo em que vivemos: nenhum país, por mais draconianas que sejam as medidas adotadas para conter a proliferação da pandemia, por mais generosos que sejam os estímulos e compensações à economia, escapará incólume a esta crise.
A questão, agora, é o que deveremos fazer quando a tempestade passar. Há quem já se refira a esse período como o “pós-globalização” ainda que, em rigor, não saibamos exatamente o que isso significará. Seguramente não queremos voltar a ter um mundo cheio de fronteiras, físicas e simbólicas. Não queremos dar fôlego a discursos securitários e xenófobos. Não queremos abdicar do poder que nos dá o facto de trabalharmos em conjunto. No conhecimento. Na saúde. Nos negócios.
Teremos, contudo, de encontrar estratégias que nos permitam caminhar lado a lado sem sermos demasiado dependentes uns dos outros. No caso da União Europeia, o espaço comum em que nos inserimos, isso passa por conquistar ou recuperar soberania e liderança em áreas onde fomos sendo ultrapassados. Nomeadamente na ciência e inovação, fundamentais para que sejamos capazes de desenvolver – sem ter de esperar por terceiros – as soluções para desafios a médio e longo prazo, como o combate às alterações climáticas, ou crises súbitas como a que agora vivemos com o coronavírus.