O programa EU4Health, com um orçamento de 5,1 mil milhões de euros, no presente quadro financeiro plurianual, pode ser considerado uma gota de água no universo dos fundos europeus. Contudo, carrega em si mesmo uma enorme ambição, que se tornou mais viável na sequência da pandemia de covid-19: a construção de uma verdadeira União Europeia da Saúde.
Em causa está um esforço conjunto para respondermos a desafios que são comuns a todos Estados-membros. Não apenas em momentos de crise, como aquela que foi desencadeada pelo coronavírus, mas para lidarmos com problemas que afetam dezenas de milhões de europeus. Nomeadamente, as doenças raras, as doenças oncológicas, as doenças cardiovasculares e a diabetes, entre outras.
A construção desta União Europeia da Saúde implicará uma aposta bem mais decidida do que aquela que é consubstanciada no EU4Health, abrangendo fortes investimentos e coordenação em domínios como as infraestruturas, a investigação científica e a inovação e o investimento no reforço das qualificações dos cidadãos, desde o treino de mais especialistas ao reforço da literacia em saúde de toda a população, com especial atenção aos doentes e às suas famílias.
Este último aspeto é particularmente importante porque as nossas esperanças de desenvolvermos uma cooperação mais intensa serão irrealizáveis sem o desenvolvimento de um Espaço Europeu de Dados da Saúde, cuja implementação não pode deixar ninguém para trás.
A criação de um Espaço Europeu de Dados, abrangendo o setor da saúde, é uma das prioridades da Comissão Europeia para a presente legislatura. A sua implementação servirá dois objetivos fundamentais. Por um lado, apoiar diretamente a prestação de cuidados de saúde. Por outro, contribuir para a investigação científica e para a elaboração de políticas públicas neste setor. Ambos poderão conduzir-nos a ganhos significativos de eficácia, não apenas nas respostas dadas aos doentes, mas também no retorno dos investimentos realizados neste setor.
Quando nos referimos a partilha de dados da Saúde, referimo-nos a registos de saúde eletrónicos, dados genómicos, dados referentes a processos clínicos de doentes, e outros que possam contribuir para melhor compreendermos os problemas de saúde que afetam os europeus e encontrarmos as melhores respostas. Temos de garantir o anonimato de todos os cidadãos cuja informação é recolhida. Esse é um aspeto absolutamente fundamental, no qual estamos obrigados ser rigorosos. No entanto, ninguém negará o potencial do digital no setor da saúde.
Os dados já existem. Olhando para a realidade portuguesa, particularmente relevante pelo peso do nosso no Serviço Nacional de Saúde, existe um manancial enorme de registos disponíveis, os quais poderiam ser postos ao serviço da melhoria da qualidade dos serviços prestados aos doentes, do diagnóstico ao tratamento. Este é, aliás, um benefício que já poderíamos estar a retirar no plano nacional. Contudo, os ganhos serão ainda superiores quando a informação nacional for cruzada com a existente nos restantes Estados-membros.
Existindo a vontade política, será preciso criar as condições para que este Espaço Europeu de Dados da Saúde se torne numa realidade. Precisamos de criar um modelo de organização que facilite o acesso e uso de dados, proporcionando as infraestruturas, como redes, interfaces e clouds de dados. Teremos de desenvolver diversas ferramentas digitais. E teremos, como referi, de investir na literacia digital dos profissionais de saúde e dos cidadãos.
Em paralelo, teremos de construir, tanto no plano interno como à escala europeia, uma verdadeira cultura de cooperação. Não apenas entre Estados-membros, mas também entre universidades, investigadores, hospitais, empresas privadas, profissionais e reguladores.
Maria da Graça Carvalho, eurodeputada do PSD