A falta de investimento privado em ciência e inovação é um problema que penaliza Portugal no presente e que nos trará enormes dissabores no futuro se não mudarmos de atitude. Ao longo das últimas décadas, o país fez um investimento consistente na qualificação dos seus cidadãos, contando hoje com indicadores – por exemplo, ao nível dos doutorados e das publicações científicas – que não nos envergonham nas comparações internacionais. Mas tudo muda quando analisamos a transposição desse conhecimento, dessas competências que soubemos conquistar, para a economia e para as empresas. Temos as ferramentas, mas, aparentemente, ainda não aprendemos enquanto sociedade a explorar todo o seu potencial.
Isso mesmo foi tornado claro pelo mais recente Ranking Europeu da Inovação, da Comissão Europeia, referente a 2020, no qual, pela primeira vez em vários anos, Portugal registou uma descida de sete lugares. Não descemos devido à pandemia, uma vez que os dados em análise são anteriores. Nem descemos, refira-se, por uma eventual quebra do investimento público. De resto, ao nível dos apoios públicos à investigação e desenvolvimento (I&D) no setor privado, estamos nesse ranking acima da média comunitária (125%).
O que penalizou o desempenho nacional no ranking foi precisamente a inclusão de indicadores novos que dizem diretamente respeito à iniciativa privada. As nossas empresas investem em I&D cerca de 50% do que fazem os seus parceiros comunitários, sendo que por trabalhador essa percentagem baixa para os 25%. As exportações de bens e serviços de alta tecnologia registam valores igualmente baixos, tal como outro indicador, mais antigo, mas onde teimamos em não melhorar, que é o registo de patentes.
Um estudo da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e da Ciência (DGEEC), divulgado na imprensa na semana passada, intitulado: “Empresas com mais despesa em atividades de I&D em 2020”, demonstra bem a dificuldade do tecido empresarial nacional em dar o salto para um ecossistema de inovação. No topo da lista dos “grandes” investidores nacionais, com uma ou outra exceção, encontram-se essencialmente empresas que se dedicam a bens e serviços. E todas com um foco muito significativo – em vários casos exclusivo – no mercado nacional.
Feito este retrato, importa perceber o que pode ser feito para mudarmos de paradigma. Ainda que o investimento público não seja hoje um problema, há um trabalho que pode e deve ser feito pelos governos. Nomeadamente ao nível do combate à burocracia e da adoção de incentivos que criem as condições propícias à inovação. Ninguém acredita que as empresas não querem investir em inovação. Se não o fazem é pelo menos em parte porque continuam a existir constrangimentos fortes.
Mas, além disso, as próprias empresas precisam de interiorizar a necessidade de mudar de estratégia, e de procurarem mais ativamente oportunidades de se reinventarem. Como relatora pelo Parlamento Europeu de diversas parcerias com a indústria, em setores como a Aviação, a Ferrovia, a Energia, o Ambiente, o Digital e a Saúde, ficaria muito satisfeita se assistisse a um aumento significativo da participação das empresas nacionais nestes programas, que lhes permitiriam partilhar esforços integrando consórcios, aprender com quem já deu este passo. Por exemplo, com a Bélgica, um país relativamente pequeno, ainda que com uma população comparável à nossa, que tem feito das exportações de produtos resultantes do investimento em I&D um dos seus segredos.
Se não dermos este passo agora, numa altura em que todos os programas e fundos europeus – dos orçamentos comunitários aos planos de recuperação e resiliência – estão virados para a inovação, como grande ferramenta para alcançarmos as transições verde e digital, passaremos muito tempo a correr atrás do prejuízo.