Bruxelas prepara-se para deixar cair os seus ideais de comércio livre". Foi desta forma que o jornal Político enquadrou, numa notícia publicada nesta segunda-feira, as declarações da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, quando, referindo-se à aprovação pelos Estados Unidos do Inflation Reduction Act (IRA), disse que "a nova política industrial assertiva dos nossos concorrentes exige uma resposta estrutural".
Começando pelo óbvio, o título e as conclusões daquele prestigiado jornal, apontando para uma possível guerra de subsídios entre a União Europeia e os Estados Unidos, envolvendo também a China, são manifestamente exagerados. Uma guerra comercial, com de resto já foi afirmado por diferentes responsáveis da Comissão Europeia, seria não apenas quase impossível de ganhar como perigosa para a União Europeia. Sobretudo em relação aos Estados Unidos.
Mas não deixa de ser um facto que a Europa se encontra atualmente numa encruzilhada, na qual precisa de se posicionar para enfrentar dois grandes desafios: a questão da energia e o combate às alterações climáticas, reforçando ao mesmo tempo a sua autonomia e a competitividade da sua economia e da sua indústria.
Já aqui escrevi sobre o Inflation Reduction Act, que se caracteriza por uma política fiscal de forte incentivo à transição ambiental e de desincentivo do investimento nos combustíveis fósseis. E continuo a acreditar que o problema, para a Europa, não está nesse plano, mas nas dificuldades que sentimos para implementarmos as nossas próprias estratégias, desde a Lei do Clima e o pacote Fit-for-55, aos planos de recuperação e resiliência.
No Partido Popular Europeu, em especial através da Comissão da Indústria, Investigação e Energia, no Parlamento Europeu, está neste momento em curso uma reflexão assente em quatro grandes lições que podem ser retiradas do IRA.
As duas primeiras estão relacionadas. Uma é a constatação da urgência de se produzir energia a preços competitivos, respeitando os objetivos ambientais. É por isso que os Estados Unidos estão a fazer uma aposta nas renováveis que, segundo indicam as projeções, irá levá-los a suplantar rapidamente a Europa em termos de cumprimento das metas de redução das emissões de CO2. A segunda lição prende-se com a consolidação do desenvolvimento do hidrogénio como vetor energético. Aqui, não estão em causa subsídios e sim investimento que tem de ser feito. Em investigação científica e inovação, para o amadurecimento da tecnologia. Em infraestruturas. Na qualificação de recursos humanos.
A terceira lição, desde logo dissuasora de quaisquer guerras comerciais, é que os produtos europeus terão de continuar a ter acesso ao mercado norte-americano. A União Europeia e os Estados Unidos têm trocas que totalizam quase 1,2 biliões de euros anuais. É uma relação mutuamente benéfica, com a balança a pender mais para o lado europeu na componente dos bens e para o lado norte-americano no lado dos serviços. Cerca de 9,4 milhões de pessoas - pouco menos do que a população portuguesa - têm empregos diretamente relacionados com esta relação comercial.
Finalmente, a quarta lição é que a União Europeia tem de implementar uma política industrial que seja uma resposta a este IRA. Essa resposta pode e deve passar pela valorização da produção local, pela recuperação da capacidade industrial que temos vindo a perder. Fazê-lo é muito diferente de adotar aquilo a que chamamos de políticas protecionistas. E pode e deve passar, como pretendem fazer os Estados Unidos, nomeadamente com as indústrias de consumo intensivo de energia, por ajudarmos este setor a fazer as adaptações necessárias para a sua sustentabilidade económica e ambiental no futuro.
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