O ano novo começou com muita incerteza, entre informações contraditórias sobre a evolução da pandemia, anúncios de iminentes subidas nas taxas de juro e volatilidade nos mercados. Se o mês de janeiro, ainda que simbolicamente, representa para muitos uma mudança de ciclo, é natural que a apreensão esteja mais presente do que o otimismo nas projeções de 2022.
A questão é saber até que ponto esse sentimento é razoável, fruto de circunstâncias que não temos inteiramente a capacidade de controlar, e até que ponto é também o resultado de declarações e atitudes contraproducentes de personalidades, incluindo especialistas, às quais se pedia maior comedimento e ponderação.
Pensando no caso concreto da pandemia, o que temos por certo, para já, é que efetivamente - sobretudo tendo em conta os dados recolhidos no Reino Unido - a variante Ómicron parece ser menos grave do que as antecessoras. Sabemos ainda, nomeadamente pela realidade portuguesa, com taxas de cobertura próximas dos 90%, que as vacinas são comprovadamente eficazes a reduzir os casos graves. Mas sabemos também que a nova variante é muito mais contagiosa do que as anteriores e que nos encontramos numa nova vaga que poderá ainda prolongar-se por mais alguns meses, com a pressão sobre os serviços de saúde a atingir já uma dimensão preocupante.
Não faz qualquer sentido, em Portugal ou em qualquer outro ponto da Europa ou do mundo, que se esteja nesta fase a teorizar - ou pior: a decidir - em função de uma suposta passagem da COVID-19 a endemia. O foco tem de manter-se no controlo da doença e não em informações contraditórias cujo único resultado é aumentar os níveis de incerteza numa população que, de uma forma geral, tem revelado grande resiliência e sentido de responsabilidade individual e coletivo. Mas que naturalmente não é imune ao desgaste de dois anos de pandemia.
A incerteza não é em si mesma negativa. No processo de aconselhamento científico, que não me canso de defender, é mesmo um elemento fundamental. É a partir do confronto entre diferentes perspetivas e indicadores que se chegam a conclusões que se podem materializar em recomendações eficazes para os decisores políticos. Mas fazer esse debate no espaço público, com a mesma leveza de quem discute preferências clubísticas ou gostos musicais, não beneficia ninguém. Para confundir já bastam os teóricos de conspiração e os negacionistas da evidência científica.
É importante que se perceba que, por muito que esta pandemia continue a condicionar as nossas vidas, o mundo não pode parar enquanto aguardamos pelo seu epílogo, tudo questionando a cada novo capítulo. A pandemia continua muito presente. Mas não tem de ser, nem pode ser, omnipresente.
Há uma recuperação económica para fazer. Reformas importantes para implementar. Na Justiça e na Fiscalidade, no investimento público e privado, na Educação, Ciência e Cultura. Continuamos a ter de enfrentar os desafios das alterações climáticas, da digitalização da economia, da modernização e recuperação dos setores produtivos, da competitividade da economia, da valorização das empresas, em particular as PME, e da criação de emprego e riqueza. Temos um futuro para construir com determinação e confiança.
Portugal é um país onde se discute muito, desde o importante ao acessório, onde se questiona muito - até o que comprovadamente se fez bem -, onde se dissecam os temas até à exaustão. Mas também um país onde frequentemente se demora demasiado a retirar conclusões e a passar à ação.
A minha esperança e a minha fé é que, a partir do final deste mês, entremos de facto num novo ciclo que nos leve até onde podemos e merecemos estar.