No passado dia 1 de fevereiro, a Comissão Europeia adotou um documento estratégico, apresentado ao Parlamento e ao Conselho Europeu, onde se propõe delinear "um plano industrial para a era das emissões zero [de CO2]". É uma proposta em linha com os objetivos do Pacto Ecológico Europeu, e sobretudo uma resposta, algo tardia, à adoção, pelos Estados Unidos, de um ambicioso plano de revitalização da indústria, o Ato de Redução da Inflação (IRA), que tem precisamente na transição ecológica a principal linha de toque da sua estratégia de crescimento.
Para se ter uma ideia do que está em causa, prevê-se que o plano norte-americano, feito sobretudo por via de incentivos fiscais, mobilize cerca de 330 mil milhões de euros até 2032. E outros países, como o Japão, a Índia, o Reino Unido e o Canadá, têm já em marcha iniciativas semelhantes. O nível de exigência está, por isso, muito alto.
E o que se pode dizer, para já, da iniciativa da equipa de Von der Leyen é que, embora toque nos pontos certos, ao nível do que são as suas prioridades estratégicas, tem poucas novidades e alguma falta de concretização em diversos domínios.
A proposta assenta em quatro grandes pilares ou linhas de atuação: um ambiente regulamentar previsível e simplificado; acesso mais rápido a financiamento adequado; desenvolvimento e valorização de competências; e a criação de cadeias de abastecimento industriais resilientes, através do comércio livre. E o primeiro aspeto que salta à vida é que a esmagadora maioria das medidas apresentadas para ilustrar estas ambições já existia ou estava na calha. Mais do que fazer um plano novo, para fazer face à altamente disruptiva aposta dos Estados Unidos, a Comissão Europeia está a agregar iniciativas.
É o caso, no primeiro pilar, dos incentivos ao desenvolvimento de tecnologias-chave para a transição ambiental, tais como como baterias, energia eólica, bombas, energia solar, eletrolisadores e tecnologias de captura e armazenamento de carbono. Ou, no campo das competências, da Estratégia Europeia para as Universidades.
Não há nada de errado em aproveitar o trabalho já planeado, sobretudo quando se pretende obter resultados a curto prazo. E isso é particularmente válido na questão do financiamento, onde a Comissão Europeia - e bem - aponta para o recurso aos programas e mecanismos de financiamento já existentes, como o NextGenerationEU, os Planos de Recuperação e Resiliência nacionais, o programa-quadro Horizonte Europa, os fundos regionais e o InvestEU, deixando depois em aberto a eventual criação de um fundo soberano.
Nesse capítulo, como nos restantes, os pressupostos parecem-me corretos. Todos queremos que as empresas tenham de lidar com menos burocracia e que os processos sejam mais ágeis. Todos queremos agilizar o acesso ao financiamento, articulando financiamentos nacionais e fundos europeus, com o cuidado de não acentuar assimetrias. Todos queremos reforçar as qualificações da população. Todos queremos um Mercado Único reforçado, que seja funcional e assegure o acesso às tecnologias e matérias-primas necessárias à autonomia estratégia e à bem-sucedida transição energética da indústria europeia. Com a valorização dos padrões europeus. Com maior cooperação dentro da União Europeia e com os nossos principais parceiros.
Mas falta explicar e concretizar. Gostaria de ter visto, nesta proposta, ser dada uma maior ênfase à questão do digital, que é de importância crítica. Gostaria de ter visto ser reconhecido um papel mais importante ao investimento na ciência e na inovação. E de uma aposta nas competências que fosse para além de genéricas boas intenções, concretizando objetivos para atrair mais jovens e mais mulheres para as engenharias e para as tecnologias da informação e da comunicação.
É certo que este é um documento mais geral. Que será discutido no Conselho Europeu desta quinta-feira e na próxima plenária de Estrasburgo do Parlamento Europeu. E que se seguirão iniciativas legislativas concretas em diversos campos. Mas como visão estratégica parece pobre face à enormidade dos desafios que temos pela frente.
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