Historicamente, o feminismo tem significado a defesa da igualdade de tratamento e oportunidades entre os géneros: a afirmação das mulheres, como iguais, num mundo durante muito tempo dominado pelo género masculino.
Não foi isso, aparentemente, que o antigo Presidente norte-americano, Barack Obama, fez no mês passado, durante uma conferência sobre liderança em Singapura, na qual afirmou, sem hesitação, que as mulheres “são melhores” do que os homens e que bastariam dois anos com estas à frente dos destinos das principais potências mundiais para assistirmos a melhorias “a todos os níveis”.
Esse é o tipo de declaração que, recordaram de imediato várias vozes críticas, nomeadamente femininas, pouco serve à causa dos direitos das mulheres. Desde logo por basear-se no pressuposto (só assim se pode afirmar existir superioridade de um género sobre o outro) de que estas são diferentes dos homens, e que se comportam de formas distintas em funções idênticas.
Assim, somos forçados a perguntar o que pretendia Obama. É provável que acredite mesmo que as mulheres têm caraterísticas específicas, as quais poderiam ser benéficas face a alguns dos problemas que o mundo atravessa.
Basta lembrar a importância que sempre deu ao papel da sua mulher Michele no próprio trajeto de sucesso. Mas entendo também aquelas palavras como uma provocação destinada a gerar reações. Como se quisesse, no fundo, afirmar: “Se estou errado, provem-no, criando condições para que mais mulheres sejam eleitas e nomeadas para cargos decisivos”.
E porque sentiu a necessidade de lançar esse desafio? Talvez por acreditar que, por mais paradoxal que tal continue a parecer a tantas pessoas, promover a igualdade nem sempre significa tratar todos da mesma forma.
Em 2012, a Comissão Europeia decidiu avançar com uma iniciativa destinada a promover um maior equilíbrio de género entre administradores não executivos de sociedades cotadas em bolsa. Uma iniciativa que ficaria conhecida como a diretiva Women on Boards (WoB). O objetivo era assegurar uma representação de pelo menos 40% de mulheres nestes cargos até 2020. Não aconteceu.
Aliás, a referida iniciativa, apesar de ter recebido o apoio do Parlamento Europeu, nunca chegou sequer a ser adotada, muito menos implementada, porque enfrentou sempre oposição no Conselho da União Europeia. E uma oposição vinda em muitos casos de alguns dos países mais progressistas do continente em matéria de igualdade de género.
Porque é que isso sucedeu? Precisamente porque para esses países a ideia de igualdade de tratamento é inconciliável com a criação de quotas de género, sejam estas aplicadas à política, à educação ou ao setor privado. Tal como os críticos das afirmações de Obama terão considerado que o seu elogio das mulheres só serviu para enfatizar fossos reais ou imaginários entre os géneros, para estes estados progressistas, impor estas quotas equivaleria a um atestado de menoridade do sexo feminino.
Na presente legislatura do Parlamento Europeu, na Comissão FEMM (Direitos da Mulher e igualdade de Género) serei uma das relatoras do Women on Boards, que uma vez mais fará o seu percurso entre as diferentes instâncias comunitárias. E o meu primeiro desafio será precisamente tentar encontrar formas de convencer estes países de que estão errados, por estarem a projetar as suas próprias realidades em contextos bastante distintos.
Na Suécia, como em vários outros países, não é preciso criar quotas para que as mulheres tenham o seu espaço de afirmação, porque esta, no essencial, já foi atingida. Nos países, onde a justa retribuição do trabalho é um dado adquirido, o salário mínimo poderá parecer um proforma desnecessário. Mas quando tentamos coexistir num espaço comum alargado, temos de ter consciência de que as decisões que tomamos, que ajudamos a tomar, se estendem para além das nossas próprias fronteiras. E que a melhor forma de preservarmos as nossas próprias conquistas é assegurar que outros as atingem também.