Duas imagens, quase antagónicas, separadas por alguns dias. A primeira, uma parada de talibãs, desfilando em jipes Humvees novinhos em folha que tinham sido entregues pelos Estados Unidos ao exército afegão. A segunda, um grupo de mulheres incrivelmente corajosas, manifestando-se nas ruas de Herat pelo direito à educação, ao trabalho e à segurança.
Naqueles dois instantes estão resumidos os maiores erros de cálculo, mas também os principais benefícios, de duas décadas de presença norte-americana no Afeganistão. De um lado, a despesa militar - a própria e a destinada a armar e a treinar um exército afegão de 300 mil homens que caiu facilmente perante o avanço dos talibãs. Do outro, o investimento na reconstrução do país e na qualificação da sua população, nomeadamente das mulheres. Uma iniciativa que, como já escrevi, ficou muito aquém das aspirações iniciais. Mas que teve ainda assim o condão de dar ao país uma nova geração mais qualificada do que as anteriores, mais aberta ao mundo, e por isso menos disposta a ser subjugada por fanáticos.
Não é preciso pensar muito para perceber qual das apostas deu frutos. E essa evidência torna ainda mais dolorosa a contabilidade dos custos económicos - para além de todos os outros - deste conflito. De acordo com o relatório Costs of War Project, da Universidade de Brown, entre a chegada ao Afeganistão, em 2001, e a sua retirada finalizada há dias, os Estados Unidos terão gasto perto de 1,86 biliões de euros. A fatia substancial deste investimento foi consumida pela despesa da sua presença militar no país. Para a reconstrução do Afeganistão foram alocados cerca de 122 mil milhões de euros. Destes, mais de 80 mil milhões destinaram-se às forças armadas do país.
Estes são números que nos devem fazer pensar - nomeadamente a nós, europeus - quando chegar a hora de se decidir como iremos apoiar a população afegã no futuro.
Para já, a prioridade é garantir a segurança de quem pretende deixar o país, nacionais e estrangeiros. Por isso estive entre os eurodeputados que, recentemente, escreveram uma carta apelando ao empenho da União Europeia na proteção destes refugiados. E, por isso, fiquei muito satisfeita por ouvir, não apenas a presidente da Comissão Europeia, Úrsula von der Leyen, como o alto representante para a política externa da União, Josep Borrel, assumirem o "dever moral" de resgatar o maior número de pessoas possível.
Mas teremos de ir mais longe. Teremos de fazer tudo o que esteja ao nosso alcance para ajudar o povo afegão. Os que agora procuram refúgio além-fronteiras e os que ficaram no país. Ajudá-los do ponto de vista da proteção de direitos básicos, como a alimentação e a habitação, mas também apostando naquilo que resultou. Naquilo que permitiu acender uma pequena chama de esperança para o país: a educação, a informação, o conhecimento. Todos infinitamente mais baratos do que armas e exércitos. E muito mais eficientes como ferramentas para a paz, crescimento e segurança.