Críticas Ministro da Educação foi chamado ao Parlamento para responder à exclusão de 5000 investigadores no último concurso da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Argumentou que não havia desinvestimento e que opção se deve à diversificação dos apoios. Também em Lisboa, Paul Nurse, Nobel da Medicina, lembrou que a crise pode justificar cortes nesta área
Nuno Crato rejeita desinvestimento
"É um mito que é preciso refutar. O Governo não desinvestiu na ciência, nem na formação avançada." Foi desta forma que o ministro da Educação respondeu aos deputados da oposição que o questionaram, ontem de manhã no Parlamento, sobre o corte nas bolsas individuais.
Nuno Crato pediu ainda à oposição que não confundisse as bolsas individuais com o total de bolsas em execução e de projetos. Às críticas de desinvestimento na ciência e na investigação, o governante respondeu com números: disse que a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) apoia neste momento mais de 12 mil investigadores e que o financiamento científico efetivo aumentou de 410 milhões de euros em 2011 para 424 milhões em 2013. A estes dados, Rita Rato, do PCP, respondeu lembrando que os cortes no Orçamento do Estado para a ciência tinham sido de" 82 milhões de euros desde 2011".
O ministro respondeu que os seus números dizem respeito à execução efetiva e não ao Orçamento. Nuno Crato não respondeu, no entanto, às questões sobre o futuro dos 5000 candidatos excluídos nos últimos concursos individuais nem às suspeitas de irregularidades nos concursos. "O presidente da FCT vai estar cá hoje [ontem] à tarde e terá oportunidade de explicar essas questões", respondeu Nuno Crato.
E à tarde, o presidente da FCT, Miguel Seabra, negou qualquer irregularidade nos concursos, defendendo que a alteração de resultados nas candidaturas se deveu à "forte pressão" e a "defesa dos interesses dos candidatos". Miguel Seabra reconheceu que a FCT "devia ter informado atempadamente todos os membros dos painéis" de avaliação das alterações efetuadas, mas invocou "forte pressão e os compromissos assumidos com os bolseiros".
Alegou ainda que a instituição procurou assegurar que nenhuma candidatura fosse aprovada com "base num erro aritmético" e, defendeu Miguel Sebara, se não fossem feitas imediatamente essas correções, a FCT demoraria "mais um mês a publicitar os resultados".
Já a redução das bolsas individuais de doutoramento e pós-doutoramento ficaram a dever-se à "necessidade de diversificar" o apoio à investigação, já que o Governo quer apostar mais em instituições.
Nobel adverte que ciência é pilar social
Mesmo com a crise, não pode nem deve haver cortes no sector científico, porque a ciência é um dos pilares em que assenta o desenvolvimento das sociedades modernas e democráticas. É desta forma direta e cristalina que o Prémio Nobel da Medicina e atual presidente da Royal Society (congénere britânica da Academia de Ciências), Paul Nurse, vê o atual momento europeu e português.
O geneticista britânico esteve ontem em Lisboa para falar sobre "o papel essencial" que a ciência tem no mundo moderno, no âmbito da conferência "Ciência, Cultura e Inovação", promovida pela Fundação Francisco Manuel dos Santos e pela Universidade de Lisboa (UL). Ao DN, afirmou que "cortar nas verbas do sector científico é também dar a mensagem errada aos jovens, dizendo-lhes que no seu próprio país não poderão prosseguir uma carreira científica".
O financiamento da ciência em Portugal foi, aliás, uma das questões presentes nas várias intervenções, ao longo do encontro.
O mote foi dado logo de início pelo reitor da Universidade de Lisboa, António Cruz Serra. "Este é um momento muito complicado para as universidades, para a ciência e para o País", afirmou o reitor da UL, sublinhando que Portugal "só sairá da crise com riqueza e só terá riqueza se tiver boa ciência e universidades de excelência com as verbas necessárias para o seu bom funcionamento". E criticou:
"O que vemos é que em relação a 2006 temos menos 50% das verbas. Em2014, as universidades perdem mais 30 milhões de euros e a Universidade de Lisboa, oito milhões."
Já a eurodeputada do PSD e ex-ministra da Ciência, Maria da Graça Carvalho, reconheceu na sua intervenção, depois de questionada sobre os cortes drásticos na atribuição de bolsas de doutoramento e de pós-doutoramento no último concurso individual de bolsas, que "falhou o debate com a comunidade científica sobre a mudança de modelo de financiamento do sector, que foi muito abrupta".
"Os números mostram que as verbas da FCT [Fundação para a Ciência e Tecnologia] não diminuíram, mas houve uma transição muito brusca. Passaram a ser financiados mais projetos e bolsas em programas doutorais, e isso devia ter sido discutido e comunicado, pelo menos com um ano e meio de antecedência, e não foi."