O Intergrupo Parlamentar: “Investimentos Sustentáveis de Longo Prazo e Indústria Europeia Competitiva”, será presidido por mim e outros dois eurodeputados, Simona Bonafè e Dominique Riquet. Estão representados os três maiores grupos políticos do Parlamento Europeu. Tem como principal objetivo fazer a ponte entre os decisores políticos - tanto ao nível das instituições europeias como dos governos nacionais - e dois setores fundamentais da nossa economia: o financeiro e o industrial. A componente da sustentabilidade tem um duplo significado: a sustentabilidade económica destes setores e a sustentabilidade ambiental que terá de ser garantida nas suas atividades.
Nesta altura, todos - decisores políticos, indústria, académicos - estão à procura das melhores respostas (porque serão várias) para essa questão. Uma coisa é certa: para que estes desafios sejam ultrapassados, não bastará proclamarmos ambições, nomeadamente em termos de metas climáticas. Terão de ser tomadas decisões fortemente suportadas por evidências, para garantir que o que fazemos resulta. E terão de ser criadas condições - em termos de acesso a apoios e financiamento, na simplificação de procedimentos, no respeito pelas diferentes realidades setoriais e regionais -, para garantir que a indústria não será entregue a si própria. A transformação ecológica é o principal desafio, tendo em conta os prazos delineados. Atualmente estamos a apontar para a neutralidade carbónica da União Europeia em 2050, dentro de três décadas, o que é muito pouco face às adaptações que serão necessárias, sobretudo para as indústrias consumidoras intensas de energia, como os metais, cimentos, vidros e cerâmicas. Além disso, como refere, temos pela frente o importantíssimo desafio da digitalização, ao qual acrescentaria ainda a necessidade de defender a liderança europeia face à crescente concorrência de outras regiões. Na minha opinião, nenhum destes objetivos será concretizável sem uma decidida e consistente aposta na ciência e inovação e na transferência de tecnologia para a indústria. Sem mais ciência, não conseguiremos alcançar os nossos objetivos mantendo-nos competitivos.
O facto de Portugal já ter apresentado um ambicioso e bem estruturado Plano Nacional de Energia e Clima não significa que estejamos bem preparados para a implementação do European Green Deal. Seria um erro histórico acreditar que este não será um desafio para nós. Já estamos a ser desafiados. Recentemente, dois projetos de enorme interesse estratégico para o país - a terceira ligação de gás a Espanha e o gasoduto dos Pirenéus (projeto STEP), desapareceram da lista de Projetos de Interesse Comum da União Europeia porque Espanha e França decidiram deixá-los cair. Estou otimista na possibilidade de os recuperarmos, muito graças à ação dos eurodeputados portugueses no Parlamento Europeu, nomeadamente do PSD. Mas este é um exemplo do tipo de desafio que pode surgir. Face ao Green Deal, existe na Europa uma forte oposição a novos projetos de gás. Mas se é verdade que existem países onde esse investimento já não é necessário, há outros, como Portugal, para os quais continua a fazer sentido, numa perspetiva de transição para combustíveis gasosos renováveis e para o hidrogénio. Por outro lado, há vários setores-chave da economia portuguesa que poderão deparar-se com dificuldades para se ajustarem ao Green Deal. Os já referidos consumidores intensivos de energia, mas também outras atividades que poderão parecer menos óbvias, como os têxteis, estes numa perspetiva do seu impacto no ambiente. O próprio turismo pode ser ameaçado com a possível taxa de CO2 sobre a aviação comercial. Por outro lado, tal como na restante União Europeia, existe o risco de deslocalização da produção para países menos empenhados em termos de ação climática. Portugal tem de criar as condições internas para que a sua indústria sobreviva e prospere, e tem de defender intransigentemente os seus interesses juntos dos seus parceiros. Já perdemos várias “revoluções industriais” na Europa. Não devemos repetir o erro naquela que já está em marcha.
É a primeira vez que surge um intergrupo dedicado à indústria no Parlamento Europeu. E não é por acaso que isso sucede nesta altura. Perante os enormes desafios que temos pela frente, é mutuamente benéfico criar esta plataforma privilegiada de diálogo entre as partes. Os parceiros privados querem partilhar as suas preocupações e não ser apanhados de surpresa pelas decisões de Bruxelas. Os políticos querem ter a certeza de que tomam decisões informadas e eficazes, que não irão criar problemas adicionais em vez de soluções. Nesse sentido, a principal mais-valia que este intergrupo poder trazer às empresas é a previsibilidade e eficiência das decisões políticas. E esses, como sabe, são dois aspetos muito importantes para a indústria.
O Horizonte 2020 foi histórico para Portugal: pela primeira vez, o País foi beneficiário líquido em vez de contribuidor líquido de um programa-quadro na Ciência. Ou seja: as universidades, centros de investigação e empresas nacionais conseguiram captar mais fundos do que aqueles que o país entregou para o bolo comunitário. Nesse sentido, não há como negar que o país teve um bom desempenho neste programa-quadro. Este desempenho teve um significado muito especial para mim, porque fui relatora das propostas de simplificação e do próprio programa específico do Horizonte 2020, no Parlamento Europeu, e algumas das emendas que nessa altura conseguimos introduzir vieram a revelar-se muito importantes para que as instituições portuguesas conseguissem chegar a fundos competitivos que antes estavam fora do seu alcance. Dito isto, espero que o desempenho de Portugal continue a melhorar no novo programa-quadro. Não devemos dar-nos por satisfeitos com o que já foi alcançado.
O Horizonte Europa é o mais ambicioso programa-quadro de sempre na Ciência, tanto em termos de fundos - cujo envelope global continua a ser debatido - como nos desafios estabelecidos. Será, como referi, de importância crucial para que alcancemos as metas do European Green Deal, a digitalização e modernização da nossa economia, a manutenção ou recuperação da liderança industrial e tecnológica a nível mundial e o bem-estar geral dos nossos cidadãos. Um dos principais desafios deste programa-quadro, no imediato, será gerir a relação com o Reino Unido pós-Brexit. O Reino Unido era, de forma destacada, o principal beneficiário líquido do Horizonte 2020. E era também o principal motor da União Europeia em termos de Ciência e Inovação. A relação futura não poderá ser a mesma, mas temos tudo a ganhar em manter esta ligação.
A tecnologia é o motor da transformação digital, por isso, não posso concordar com essa ideia. Basta pensarmos no crescimento exponencial da capacidade de processamento e de memória dos computadores nas duas últimas décadas, graças à miniaturização dos componentes, e do que isso significou para a nossa sociedade, para percebermos como os dois conceitos estão interligados. Dito isto, de facto a tecnologia é a base, mas depois há todo o ecossistema: as competências, a forma como a tecnologia é utilizada, as considerações éticas que devem ser feitas em relação à utilização de cada tecnologia. Por exemplo, em relação à Inteligência Artificial, que é um dos temas importantes do momento na União Europeia.
À indústria portuguesa, a mensagem que gostaria de deixar é: podem contar connosco, no Parlamento Europeu, para defendermos os vossos interesses junto da Comissão Europeia e do Conselho Europeu. Sabemos que os passos que lhes serão exigidos, quer no que respeita à transição climática quer no que respeita à digitalização, exigirão suporte financeiro e legal, e estamos cá para fazer a nossa parte. Diria também que devem estar especialmente atentos, não só às novas obrigações, mas também às oportunidades que irão surgir no contexto do European Green Deal e de outros temas em cima da mesa, nomeadamente ao nível do mercado único. Teríamos todo o gosto em acolhê-los, individualmente ou integrados em associações setoriais, no intergrupo recém-constituído. Dos grandes desafios que temos pela frente poderão também surgir grandes oportunidades. Por último, um apelo a que cada vez mais seja potenciada a transferência de tecnologia das universidades e centros de investigação para as empresas. A inovação é o rumo certo para garantir a competitividade duradoura da nossa indústria.