Quando a presidência alemã do Conselho da União Europeia se sentar à mesa com a equipa de negociadores do Parlamento Europeu, da qual faz parte o meu colega José Manuel Fernandes, para discutir as alterações ao Quadro Financeiro Plurianual (MFF) 2021-27, não estarão em causa apenas números e programas. Em cima da mesa estará também a ideia do que é e do que deve ser no futuro esta nossa Europa.
Todos – governos, eurodeputados, Comissão Europeia – ficámos satisfeitos com a existência de um entendimento sobre o Plano de Recuperação da COVID-19 e o próximo MFF, que permitiu assegurar que cada estado-membro terá acesso a financiamentos adequados para relançar a sua economia e ultrapassar a crise. Todos concordámos com o caráter inovador de algumas das soluções encontradas, nomeadamente a própria Comissão Europeia ir aos mercados, apoiada pelo orçamento comunitário, para financiar esta recuperação.
Mas quem vê na Europa mais do que uma solução utilitária para problemas conjunturais e nacionais não pode ter ficado conformado com o contraponto saído daquela cimeira do Conselho Europeu: o desinvestimento na competitividade, liderança e sustentabilidade futura da União Europeia. Essa parte do acordo, não há outra forma de o dizer, é profundamente penalizadora.
Os programas geridos pela comissão, que financiam o trabalho conjunto entre parceiros de vários estados-membros, em áreas como a Educação, a Ciência, a Inovação, a luta contra as alterações climáticas a Saúde, a Digitalização, foram todos subalternizados por este entendimento. Num certo sentido renacionalizou-se o orçamento comunitário, abdicando-se assim de dar prioridade ao projeto europeu e ao futuro da Europa, no qual se incluem as novas gerações.
Tudo isto poderá parecer, de uma perspetiva nacional, um compromisso lógico face à necessidade urgente de assegurar liquidez na economia. Mas para um eurodeputado não pode, não deve ser aceitável. Somos eleitos pelos nossos concidadãos e temos uma responsabilidade superior de defesa dos interesses nacionais. Mas estamos também ao serviço de uma câmara que foi criada para dar forma a este projeto em que nos enquadramos, na convicção de que os passos que dermos em conjunto serão mais exigentes, menos imediatos, mas que no final servirão melhor os interesses de todos.
É por isso que a posição de força assumida pelo Parlamento Europeu, no plenário de 23 de julho – relembrando que tem uma palavra a dizer sobre a aprovação do MFF, apontando claramente as falhas acima referidas, exigindo uma verdadeira negociação – é não só oportuna como plenamente justificada.
Quando, logo após a cimeira extraordinária do Conselho, assumi publicamente as minhas preocupações com as decisões tomadas relativamente ao futuro dos programas europeus, confesso que não sabia até que ponto aquela perspetiva seria partilhada pela generalidade dos eurodeputados. Sobretudo num momento de celebração de um acordo muito difícil. Mas o que se viu nos dias que se seguiram, e que ficou consubstanciado na Resolução aprovada pelas principais forças políticas, reforçou a minha confiança nesta câmara e no papel que aqui desempenhamos.
No Parlamento Europeu representamos os nossos países, as nossas cores e famílias politicas. Mas como Parlamento Europeu servimos a Europa. Tal como o faz a Comissão Europeia. Tal como o deve fazer o Conselho. Se não o fizermos, deixaremos de valer como um todo. Seremos apenas a soma das nossas partes.