Inflation Reduction Act (Lei de Redução da Inflação), promulgado em agosto deste ano pelo Presidente dos Estados Unidos Joe Biden, é um marco na história daquele país. Pretende combater a escalada dos preços através de um conjunto diversificado de medidas, desde o controlo dos custos dos medicamentos sujeitos a receitas médicas, aos incentivos à compra de automóveis elétricos e à aquisição de painéis fotovoltaicos pelos consumidores, não esquecendo o apoio às indústrias do país na transição energética.
Esta iniciativa não deixou de suscitar alguns receios, entre os quais a possibilidade de a sua aplicação se traduzir numa forma de protecionismo da economia nacional pelas autoridades norte-americanas, com consequências negativas para outros blocos. Por exemplo, na semana passada foi noticiado na Coreia do Sul que as vendas de automóveis ligeiros do país podem cair 4%, caso os Estados Unidos se recusem a oferecer benefícios fiscais aos consumidores que comprem veículos elétricos produzidos fora do seu território.
A necessidade de se evitar estas consequências, e de se confirmar que o pacote legislativo norte-americano cumpre o que está acordado ao nível da Organização Mundial do Comércio, tem tido eco na União Europeia. E precisamente por esse motivo foi criada uma task-force conjunta UE-EUA dedicada exclusivamente ao Inflation Reduction Act.
Com as eleições intercalares nos Estados Unidos, pouco se avançou neste diálogo. Até porque se antecipava uma "onda vermelha" do Partido Republicano, e não faltaram candidatos daquele partido a verbalizar a vontade de enterrar este diploma assim que se confirmasse a esperada alteração na balança do poder. Mas, agora que se verifica a manutenção do controlo do Senado pelos Democratas, e em que os Republicanos celebram sem grande entusiasmo uma magra vitória na luta pelo controlo da Câmara de Representantes, são poucos os que vaticinam uma grande mobilização contra esta iniciativa.
Até porque esta, além de ser francamente popular entre boa parte do eleitorado, também conta com o apoio de diversos setores da indústria e do próprio Partido Republicano.
Da perspetiva da União Europeia, na minha opinião, mais do que nos preocuparmos com as eventuais consequências concorrenciais deste conjunto de medidas, devemos concentrar-nos em identificar as ações que nos permitirão acompanhá-las de forma a mantermos e reforçarmos a nossa competitividade internacional.
Porque, no final de contas, as iniciativas apresentadas pela Administração norte-americana são, em geral, positivas. Positivas para os cidadãos e positivas para a indústria daquele país, que está a ter um apoio muito mais efetivo do que a europeia para lidar com a presente crise e com o desafio de corresponder às metas do combate às alterações climáticas. Apostam na inovação. Por exemplo, ao nível da energia limpa, com o hidrogénio e as pilhas de combustível.
Na Europa temos metas mais ambiciosas do que os Estados Unidos, nomeadamente na questão do clima. E podemos dizer que os nossos planos são igualmente bem delineados. Estamos ainda bastante adiantados a estes em matérias como as políticas públicas de saúde, igualmente abrangidas por aquele diploma. Mas há um capítulo em que geralmente saímos a perder, que é o da concretização atempada e eficiente das medidas.
E o facto de a UE ser constituída por 27 países independentes, cada um com as suas práticas e idiossincrasias, não justifica tudo. Não justifica, por exemplo, que não exista maior articulação dos planos de recuperação e resiliência, em especial nos projetos transfronteiriços.
Existe uma cultura de reação rápida aos desafios, nos Estados Unidos, que tem faltado a muitos estados-membros da UE, incluindo ao português. Que tem faltado à própria UE no seu todo. E essa é uma das explicações para o facto de, mesmo antes de terem aplicado este Inflation Reduction Act, os norte-americanos já estarem a conseguir inverter a curva da inflação, enquanto, por cá, esta parece ainda não ter fim à vista.