A história da aposta de Portugal no conhecimento é um daqueles casos em que os princípios estão certos, a concretização tem sido globalmente bem executada, mas os resultados tardam em aparecer. E não existe qualquer mistério em torno das causas deste impasse. São as mesmas que nos têm condenado a crescimentos económicos anémicos, aos salários baixos e à perda de competitividade face a outras nações desenvolvidas. Continuamos a ser um país pouco capaz de incentivar e recompensar a iniciativa, de valorizar o talento e de ajudar a concretizar as boas ideias. Um país pouco amigo da inovação.
Há pelo menos duas décadas que fazemos um esforço notável para elevar as qualificações da nossa população. Temos menos abandono escolar, mais diplomados, muito mais doutorados. Criámos condições para que as instituições de ensino e de investigação se modernizassem, internacionalizassem as suas atividades e acedessem a financiamento competitivo, não apenas no plano doméstico como europeu. Formámos excelentes cientistas, vários de renome mundial, nas mais diferentes áreas. E até procurámos que todo esse potencial pudesse ser aproveitado pela nossa economia, pelas nossas empresas, criando incentivos à contratação de trabalhadores mais qualificados, ao desenvolvimento e aplicação de técnicas e produtos inovadores. Mas continuamos a não conseguir dar o salto que nos permita capitalizar esse investimento.
"Frágil", "cresce lentamente", "precária" e com "pouco impacto". Era com esta desmoralizadora coleção de adjetivos que uma notícia de jornal resumia, há algumas semanas, um estudo sobre o impacto da ciência em Portugal. Um estudo onde, entre outros aspetos, se referia que apenas 6% dos doutorados em Portugal trabalham no setor privado. E onde se constatava mais uma vez o escasso retorno que obtemos do conhecimento que produzimos.
Conclusões que também podem ser retiradas das comparações internacionais. Em 2021, a propósito da divulgação do Ranking da Inovação (European Scoreboard) da União Europeia, apontei aqui algumas das causas para a quebra de Portugal neste indicador. Os obstáculos no nosso caminho. Em especial a inexistência de um ecossistema geral - em termos de simplificação de procedimentos, incentivos fiscais, estabilidade das leis e funcionamento eficiente dos tribunais - que crie as condições de mercado para que os privados invistam no conhecimento. Este ano, na nova versão no ranking, divulgada em setembro, o país até regista alguns progressos, mas mantém-se no grupo dos "moderadamente inovadores", para o qual tinha caído em 2021. Pior, segundo o relatório, "a diferença de desempenho em relação à UE é cada vez maior".
Portugal precisa de melhorar a sua política científica. De valorizar e estabilizar as carreiras dos investigadores. De reforçar o investimento público em ciência e inovação, coisa que seguramente não se alcança com o anunciado aumento de 22 milhões de euros nas dotações da Fundação para a Ciência e Tecnologia no Orçamento do Estado para 2023. Mas isso não bastará para evitar a fuga e desperdício de talento.
Portugal precisa de mais investimento privado na investigação científica e na inovação. Mas não podemos acreditar que o teremos enquanto as nossas empresas e indústrias estiverem em modo de sobrevivência. Por razões conjunturais, como a atual crise na energia, mas, sobretudo, estruturais.
Quando decidimos apostar no conhecimento, fizemo-lo cientes de que este é sempre o melhor caminho para que um país se possa tornar mais próspero e equitativo. Sobretudo um país que não conta com grandes recursos naturais, nem com as vantagens de uma localização geográfica mais central. E tivemos, como referi, bastante sucesso nesse esforço. Mas continuamos sem saber como aproveitá-lo. Ou melhor: até sabemos. O remédio está há muito identificado. O que não fazemos é tratar a doença.