A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, anunciaram nesta segunda-feira um entendimento sobre a entrada de mercadorias na Irlanda do Norte através do resto do Reino Unido. À primeira vista o assunto diz pouco aos europeus. Trata-se de ultrapassar uma questão local, relacionada com o acordo original do Brexit. Mais concretamente, de encontrar soluções mutuamente aceitáveis para manter a sujeição da Irlanda do Norte às regras do Mercado Único Europeu, de forma a facilitar as suas trocas com a vizinha República da Irlanda, sem penalizar o próprio Reino Unido.
Porém, o “fumo branco” agora anunciado, após meses de negociações, tem mais reflexos para a União Europeia do que pode parecer. É que a conclusão de alguns dossiês pendentes do Brexit, e deste em particular, tem condicionado outros entendimentos extremamente importantes para as duas partes. Nomeadamente a associação formal do Reino Unido ao programa-quadro de Investigação Científica e Inovação da União Europeia, o Horizonte Europa, cujo adiamento, ao fim de dois anos de execução do programa, vinha a causar crescente preocupação na comunidade científica dos dois lados do Canal da Mancha.
Este protocolo sobre a Irlanda do Norte, sublinhe-se, não garante que não surjam novos obstáculos a este acordo de associação ao Horizonte Europa. Contudo, sobretudo pelo peso político que tem no Reino Unido – onde está a ser descrito como o maior sucesso até à data do primeiro-ministro -, o caminho fica seguramente mais desbloqueado. E essa é uma boa notícia para todos os europeus.
Atualmente, o Horizonte Europa contempla acordos em curso com um total de 16 países de fora da UE, incluindo a Ucrânia. Estes países gozam de condições de participação que podem ser comparadas às dos Estados-membros. Já o Reino Unido tem estado até agora reduzido a uma participação mais limitada, na qualidade de país terceiro.
Ainda há dias, foi revelado, naquele país, que o governo tinha decidido retirar cerca de 1,8 mil milhões de euros, do total de 7, 8 mil milhões que tinha alocado à participação no Horizonte Europa ou em iniciativas domésticas análogas, precisamente devido a este impasse. A notícia foi prontamente desvalorizada pelas autoridades britânicas, segundo as quais a verba em causa se referia a montantes não utilizados dos últimos dois anos, e não significava de forma alguma uma desistência da participação no programa-quadro. Mas a verdade é que o arrastar desta situação não augurava nada de bom.
Os britânicos, é importante recordá-lo, estavam antes do Brexit entre os maiores beneficiários e contribuidores do então programa-quadro Horizonte 2020. Ou seja: independentemente do Brexit, existe uma relação mutuamente benéfica que importa preservar. E não apenas por questões de financiamento.
Além da excelência das suas universidades e dos seus centros de investigação e inovação, tanto nos setores público como no privado, o Reino Unido traz a este programa uma capacidade de concretização, e de implementação na prática, que não abunda na União Europeia. Por outro lado, sem poder cooperar com os melhores investigadores e as melhores instituições europeias, a comunidade científica britânica estava também limitada na sua capacidade de atuação. Até porque existia uma cultura de colaboração com os restantes países europeus fortemente enraizada.
União Europeia e Reino Unido têm objetivos comparáveis em frentes como o combate às alterações climáticas, energia, transição digital, saúde e biotecnologia. Trabalhando em conjunto, têm muito melhores probabilidades de os alcançar.
Clique aqui para ler o artigo no site do Diário de Notícias.