Recentemente, causaram polémica as declarações do Presidente da República, considerando que a situação na Ucrânia abria oportunidades a Portugal. Na minha opinião, as reações passaram ao lado do sentido da mensagem. Não me parece que estivesse em causa qualquer sugestão de aproveitamento da desgraça alheia e, sim, a constatação de que estamos a entrar numa nova realidade, em termos geopolíticos e ao nível das relações económicas, dentro da UE e da UE com o mundo, na qual podemos e devemos tentar conquistar parte do espaço que anteriormente era ocupado por terceiros.
A acrescentar alguma coisa à referida intervenção, seria para dizer que além de Portugal ser um destino seguro, nomeadamente para o setor turístico e para o investimento, tem muitas outras mais-valias.
Entre estas, a aposta no reforço das qualificações da população, que nos dá hoje números muito positivos em setores de grande demanda na UE, como as engenharias. O facto de termos uma política de investimento consistente nas energias renováveis, e de possuirmos, uma vez feitas as necessárias ligações ao Centro da Europa, uma infraestrutura promissora, tanto para as energias de transição, como o gás, como para o futuro no hidrogénio. Características que fazem de nós parceiros potenciais de outros estados-membros que querem reduzir significativamente a sua atual dependência energética da Rússia e concretizar a transição verde. E ainda, apesar de muitas vezes o desvalorizarmos intramuros, o facto de termos empresas, instituições de ensino e de investigação e recursos humanos cujas capacidades são reconhecidas.
Na última semana, participei em dois eventos nos quais Portugal esteve em grande destaque, pela positiva, perante os restantes países da União Europeia.
Entre 23 e 25 de maio, a Comissão da Indústria, Investigação e Energia (ITRE) do Parlamento Europeu, realizou uma missão a Lisboa. Desta constaram contactos de alto nível com vários membros do governo, incluindo a ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e os secretários de Estado do Ambiente e Ação Climática e da Digitalização e Modernização Administrativa. Os eurodeputados, provenientes de vários estados-membros, reuniram ainda com responsáveis da CIP e visitaram instituições de ensino e investigação e polos de inovação de referência, como a Fundação Champalimaud, a Nova SBE e o Tagus Park. Um grupo menor de deputados esteve ainda no Porto, para visitar o I3S - Instituto de Investigação e Inovação em Saúde, e reunir com investigadores do IPATIMUP e ICBAS na área do cancro.
Já nesta segunda-feira, estive na Feira de Hannover, na Alemanha, o maior evento mundial dedicado às indústrias inovadoras, que neste ano tem Portugal como país em destaque. Acompanhei a visita do nosso primeiro-ministro ao Pavilhão de Portugal, na companhia do chanceler alemão Olaf Scholz. E não é por termos cores políticas diferentes que deixarei de dizer que António Costa mostrou um bom conhecimento da realidade da indústria portuguesa e que se empenhou em promovê-la naquela feira.
O problema, como já escreveu aqui no DN a jornalista Joana Petiz, é que o primeiro-ministro tem de fazer mais do que ser um bom representante de Portugal no exterior. Tem de introduzir as reformas necessárias, em termos de simplicidade e fiabilidade das leis, fiscalidade e funcionamento da justiça, para criar no nosso país um verdadeiro ecossistema favorável à inovação e ao investimento. Com a atual maioria absoluta, não tem desculpas para não o fazer.
Refira-se que este não é um problema exclusivo do nosso país. A própria Comissão Europeia tem caído na tentação de regulamentar em excesso, em vez de criar as condições objetivas, em termos de incentivos ao investimento e desburocratização de processos, para a recuperação económica e a concretização das transições verde e digital. É isso que as empresas, nacionais e europeias, esperam e pedem. E é por isso que nos batemos no Parlamento Europeu.
* Artigo de Opinião originalmente publicado no 'Diário de Notícias' a 1 de junho de 2022