Press Digital: a soberania europeia e as alianças estratégicas

Opinion Articles | 01-06-2023 in Dinheiro Vivo

A questão da soberania digital da Europa, num contexto de cada vez maior protagonismo do setor tecnológico em todos os campos da atividade humana, tem sido um dos temas fulcrais desta legislatura europeia.

O objetivo de dotar a União de maior resiliência e autonomia no digital está refletido num conjunto muito alargado de iniciativas legislativas, como o Ato dos Mercados Digitais, o Ato dos Serviços Digitais, o Regulamento dos Circuitos Integrados e o Regulamento dos Dados, bem como em diferentes iniciativas do programa-quadro de investigação científica e inovação, o Horizonte Europa.

Na qualidade de vice-coordenadora do Partido Popular Europeu na Comissão da Indústria, Investigação e Energia (ITRE) estive diretamente ligada, como relatora ou relatora-sombra em nome do Parlamento Europeu, a várias destas iniciativas, acompanhando aspetos como a computação em nuvem, o acesso aos dados, e a capacitação tecnológica da Europa, por exemplo através da parceria público-privada área da computação de alto desempenho (EuroHPC), a qual contempla a instalação de um supercomputador em Portugal.

O chamado Guião para a Década Digital (ou Década Digital 2030) assume, por sua vez, um conjunto de metas ambiciosas a atingir até ao final da década ao nível das competências, acesso a infraestruturas digitais seguras e sustentáveis, transformação digital das empresas e digitalização dos serviços públicos.

O ponto de partida para esta aposta da União Europeia, que assume a ambição de querer tornar-se líder no setor digital, foi a consciência de que vínhamos muito rapidamente a perder terreno para outras grandes potências mundiais, investindo menos do que estes nas competências da população, na investigação científica e inovação e, principalmente, na transferência do conhecimento - que apesar de tudo continuávamos a produzir em abundância - para a economia e para a sociedade.

A Europa tornou-se demasiado dependente das grandes plataformas digitais norte-americanas no que respeita aos dados, ao seu processamento e armazenamento, e demasiado dependente dos mercados asiáticos no acesso a componentes, como os circuitos integrados. Essas fragilidades, sobretudo no que respeita ao hardware, tornaram-se particularmente evidentes durante a pandemia de COVID-19, impulsionando esta urgência de reforçar a autonomia europeia neste campo.

 

No entanto, e tendo estado ligada a várias destas iniciativas, nunca confundi soberania e capacitação da Europa como a adoção de políticas protecionistas, que contribuíssem para nos afastar dos nossos tradicionais aliados. Sempre os vi, em especial aos países democráticos, como "companheiros de percurso", com os quais poderíamos e devíamos aprofundar relações. O essencial - e daí a importância deste esforço europeu - era posicionarmo-nos como iguais e não como dependentes.

Por isso, foi com gosto que participei, neste final de maio, num debate em Bruxelas dedicado à transição "do protecionismo digital às alianças digitais", promovido por deputados europeus. No debate foram discutidas as opiniões do economista sueco Stefan Fölster, as quais não subscrevo por inteiro, mas que apontam para estratégias que me parecem fazer todo o sentido. Nomeadamente, evitar guerras comerciais nos mercados digitais, desenvolver parcerias estratégicas com estes países, e procurar criar uma lógica de complementaridade nestas relações, em alternativa a uma duplicação de esforços em determinados setores.

 

O autor em causa aponta para um eixo estratégico Europa-Reino Unido-Estados Unidos, mas eu diria que não podemos esquecer nesta equação vizinhos mais próximos, como a Suíça e a Noruega, nem potências mais distantes como o Japão, a Coreia do Sul, a Austrália e a Nova Zelândia.

Refira-se que, no que respeita aos Estados Unidos, o esforço de aproximação entre as partes tem vindo a ser feito, depois da era de agressivo protecionismo protagonizada por Donald Trump na América. Ainda recentemente teve lugar, na Suécia, a quarta reunião interministerial do Conselho de Comércio e Tecnologia UE-EUA, ao qual também estou ligada através do Parlamento Europeu, tendo mais uma vez sido reafirmada a intenção das partes de reforçarem a sua cooperação ao nível tecnológico.

 

Pode ler o artigo no site do Dinheiro Vivo.

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