Quis o destino que me encontrasse em Espanha, para participar na Assembleia Parlamentar Euro-Latino-Americana, nestes tempos de eleições gerais. Olho para os quadros de resultados nas televisões, e o que se vê é um mapa pintado em tons de azul, com as cores do PP. Mas o que dizem os analistas, e me vão confirmando os políticos espanhóis, desta e de outras forças, com as quais me vou cruzando nos corredores, é que praticamente tudo continua em aberto, incluindo a hipótese de não se chegar a uma solução de Governo.
Pessoalmente, mantenho a opinião de observadora externa que tive a oportunidade de dar no domingo a uma televisão espanhola: o Partido Popular tem todas as condições para governar sozinho com o apoio parlamentar dos partidos da Direita e Centro não-independentistas. É o que faz sentido e tem sido a tradição em Espanha (tal como no nosso país, ainda que com uma exceção recente): o partido mais votado deve ter a oportunidade de formar Governo e de governar.
Em Portugal, outros analistas vão fazendo analogias - embora "extrapolações" talvez fosse a palavra mais adequada - entre o sucedido no país-vizinho e a realidade nacional. Mais concretamente, falam da possibilidade de a ideia de um Governo de maioria absoluta, conjugando os votos do PP e do Vox, ter prejudicado os primeiros, por receio dos eleitores de verem a Extrema-Direita no poder, e comparam esta situação com a nossa, avisando que o PSD "tem de ser claro" na sua recusa de vir a governar com o Chega.
O que deveríamos retirar como lição destas eleições espanholas, na minha opinião, é que existem realidades infinitamente mais complexas do que a nossa.
De pouco importa, nesse raciocínio, que o próprio PP tenha sido sempre claro em avisar que não se coligaria com a Extrema-Direita para governar a Espanha. E de continuar a sê-lo nesta altura. De pouco importa recordar que tanto Rui Rio como Luís Montenegro foram igualmente claros na recusa em integrar elementos do Chega num Governo por si liderados. Isto, apesar de o nosso primeiro-ministro, António Costa, ter feito desse bicho-papão um trunfo eleitoral nas ultimas legislativas, possivelmente um trunfo decisivo. De pouco importa tentar explicar como os contextos e as realidades históricas dos dois países, nomeadamente a forma como cada um deles regressou à democracia, são diferentes.
O que se retira das eleições espanholas como lição, na opinião dos nossos entendidos, é que, mais do que defender projetos, valores e princípios, o que se deve fazer na campanha eleitoral é erguer muros higiénicos contra determinadas forças políticas.
Com todo o respeito, não posso concordar. No dia em que se torne mais importante para um partido demarcar-se de outros do que afirmar-se pelo que é e representa, esse partido deixará de ter razões para existir. O PP concorreu a estas eleições para governar a Espanha e afirmar-se como alternativa ao PSOE. E venceu. A maior parte dos espanhóis, em quase todas as regiões e províncias do país, deram-lhe a sua confiança. E é isso que o PSD ambiciona fazer sempre que se apresenta a eleições. Dar a estes partidos um peso político decisivo é a melhor forma de os tornar mais relevantes.
O que deveríamos retirar como lição destas eleições espanholas, na minha opinião, é que existem realidades infinitamente mais complexas do que a nossa. Países onde uma parte da população e dos políticos alimentam sonhos separatistas, onde existe um passado não muito distante de violência associada a esses sentimentos, onde existe uma multitude de sensibilidades regionais e políticas para gerir. E países que, ainda assim, conseguem ser mais competitivos do que o nosso - onde não existe nenhuma destas complexas questões, mas abunda, por outro lado, uma tendência para valorizar o acessório em vez de se dar mais atenção aos problemas reais.
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